Por Bruno Rodrigues, diretor da Vertical People Tech da Associação Catarinense de Tecnologia
Passados mais de seis meses de pandemia, é fundamental fazer uma importante reflexão: como está sendo a real experiência dos colaboradores e empresas com o home office? Se de início todos foram pegos de surpresa, sem tempo para planejar adequadamente a transição, após esse período de teste prático, já é possível tirar algumas lições sobre erros e acertos do trabalho remoto.
Naturalmente, as empresas de base tecnológica tiveram alguma vantagem na transição para o home office por conseguirem manter suas operações rapidamente de forma remota. Empresas de outros setores precisaram recorrer à tecnologia para se digitalizar e conseguir continuar seus serviços. A tecnologia é uma aliada para essa transformação digital, porém a adaptação ao trabalho remoto vai muito além da operacionalização. É fundamental que os gestores a utilizem também para avaliar, para além da produtividade, a saúde mental dos colaboradores.
Em um primeiro momento, muito se falou sobre os benefícios do home office, como não perder mais tempo no trânsito, mais tempo com a família, flexibilidade no horário de trabalho, dentre outros. Os trabalhadores se sentiram mais produtivos, as empresas perceberam que era possível criar métodos de avaliação e comunicação. Porém, com o passar do tempo, algumas coisas mudaram. Primeiro, porque a realidade de cada pessoa é única. Se durante alguns meses parecia OK trabalhar de pijamas, sentado no sofá, ou em uma cadeira inadequada, depois de um tempo as costas começam a doer, a preguiça parece bater com mais frequência e os filhos passam a exigir mais atenção.
Uma pesquisa realizada pela Social Base, integrante da Vertical People Tech e o portal RH pra Você, mapeou os erros e acertos do home office durante a pandemia. Foram cerca de 500 entrevistados de empresas de diferentes portes, sendo a maioria do segmento de tecnologia (17,30%). A maior parte (70%) respondeu que não fazia home office antes da pandemia, demonstrando que as empresas adotaram o modelo sem experiência prévia. Foram avaliados pontos como estrutura, apoio da empresa, uso de ferramentas de comunicação, treinamento para o novo modelo de trabalho.
Outro ponto avaliado foi se as empresas estão concedendo uma ajuda de custo financeira para a realização do home office, e 88,2% dos respondentes informaram que não. Também foi perguntado se a empresa ofereceu suporte de infraestrutura, como notebook, mobília de escritório entre outros, e 31% afirmaram que não. Em relação a carga horária, 48,52% apontaram que estão trabalhando mais do que antes. Um dos motivos apontados é a redução da barreira entre a vida pessoal e profissional, um dos maiores desafios quando tudo acontece no mesmo ambiente.
Em outra pesquisa – Termômetro de Crise Covid-19 – realizada pela Pulses, plataforma de pesquisa de clima organizacional contínua, mais de 400 empresas, sendo 27% do setor de tecnologia e software, ouviram seus colaboradores durante quatro meses, um universo de cerca de 130 mil pessoas. O Termômetro da Crise avaliou quatro dimensões: adaptação ao home-office, com perguntas sobre canais de comunicação com a liderança e estrutura remota; conscientização, relativa à pandemia e cuidados pessoais; resposta à crise, medindo a percepção dos colaboradores em relação à medidas adotadas pela empresas; e sentimentos e percepção, medindo o nível de ansiedade e preocupação com a pandemia.
Os resultados da Dimensão Adaptação apontaram que no início da pandemia os colaboradores (86%) se sentiam muito produtivos, porém, com o passar do tempo, essa percepção teve uma queda de 10 pontos percentuais. Quanto a estrutura remota, no início apenas 19% percebiam não ter um local e instrumentos de trabalho adequado, mas o percentual subiu para 27% em maio e estagnou em 26% em junho.
Na Dimensão Resposta à Crise, as respostas no quesito atuação pessoal, no início 87% sentiram que suas atividades não foram afetadas, porém em junho esta percepção caiu para 81%, sendo que 7% afirmam não estar conseguindo executar o seu trabalho. Os resultados na Dimensão Sentimentos e Percepção foram os mais críticos em toda a pesquisa. No mês de abril, 15% dos colaboradores afirmaram não conseguir manter a calma diante da pandemia, subindo para 19% em junho. Em relação à ansiedade, em abril 51% dos colaboradores se sentiam ansiosos ou muito ansiosos. Em junho este indicador subiu para 54%.
Os resultados das pesquisas demonstram a importância de utilizar a tecnologia também como forma de criar estratégias que visem o bem-estar e cuidar da saúde mental dos colaboradores das empresas durante o home-office e na nova realidade, na qual se tem falado em adotar um modelo híbrido, no qual todos possam ter benefícios . Em janeiro de 2020, a ACATE criou a Vertical de Negócios Peopletech, que reúne empresas de base tecnológica que atuam no desenvolvimento e comercialização de soluções para gestão de pessoas. O grupo realiza encontros periódicos e faz da atuação em rede a chave para o desenvolvimento mútuo e fortalecimento do setor de tecnologia para gestão de talentos. São soluções para recrutamento e seleção, people analytics, treinamento, avaliação de performance, operação de ponto e folha, comunicação interna, bem-estar e saúde organizacional, trabalho remoto, dentre outros. Diferentes vertentes que têm sido fundamentais com as rápidas mudanças impostas pela pandemia.
A gestão de pessoas, que por muito tempo foi ignorada nas organizações, ganhou destaque desde o início da pandemia, pois viu-se que o maior ativo das empresas sempre serão as pessoas, e com todos trabalhando de casa, é fundamental pensar em estratégias para manter equipes motivadas e oferecer suporte para o trabalho ser realizado de forma adequada. É preciso entender que esta área é um patamar estratégico para as empresas. O momento pede, mais do que nunca, inovação na gestão de pessoas. A tecnologia é uma aliada, porém é preciso obter parceiros e especialistas que busquem gerar impactos positivos e mudanças sociais por meio da tecnologia.