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Pinheiros, abelhas e os símbolos visuais do cooperativismo

Foto: Valterci dos Santos

Faço a você uma pergunta sobre um tema que abordo no meu próximo livro: já reparou que os símbolos do cooperativismo são inspirados na natureza? 

Se você puxar da memória, vai lembrar que desde a sua infância via eventualmente o desenho de dois pinheiros verdes dentro de um círculo amarelo, em diferentes lugares. Talvez estampado em um grande silo de grãos, ao passar de carro por uma zona agrícola, ou até em uma fatura da conta de luz, dependendo de onde você mora. E pode ser que também tenha reparado, ao fazer compras em um supermercado cooperativista, que o espaço era decorado com a imagem de favos e abelhas, mesmo longe da gôndola de mel. A presença desses elementos da natureza nunca esteve lá por acaso.

A história dos símbolos visuais do cooperativismo é curiosa e até poética, vale conhecer. Os mais tradicionais, os pinheiros e as abelhas, são inspirados pela natureza que, por si só, é o melhor e mais complexo modelo de cooperação que existe. Não cabe individualismo no sistema autossustentável que é a natureza, o ser humano até insiste, mas o resultado tem sido desastrado e por vezes desastroso.

Atribuir valores intangíveis às árvores é algo feito desde o tempo dos celtas, povos europeus da Idade Antiga, que viam no mundo natural símbolos de sabedoria para a vida humana cotidiana. Para os celtas, as árvores de folhas perenes, como os pinheiros, evocavam imortalidade e persistência. E por estarem entre as mais altas da floresta, refletiam também a visão de longo alcance. Os pinheiros foram o primeiro símbolo adotado internacionalmente pelas cooperativas, em 1923, significando também fecundidade, pela capacidade de expansão. A logomarca oficial trazia, então, duas árvores verdes, envolvidas por um círculo que remete à eternidade e sobre um fundo amarelo representando o sol. 

A abelha é outro símbolo que sempre esteve associado ao cooperativismo e a ações que são fruto do trabalho em grupo. As primeiras referências visuais ligadas a elas são tão antigas quanto as primeiras iniciativas do movimento: em prédios ingleses do século 19, ainda é possível visualizar a imagem de colmeias no detalhe das fachadas, usadas para identificar as cooperativas na época. A razão disso é que a dinâmica executada pelas abelhas que produzem mel é uma das ações mais engenhosas (e colaborativas) da natureza, e costuma servir de exemplo para ensinar às crianças o que é cooperação. Vou pedir perdão aos biólogos e explicar em linhas gerais como isso funciona. 

Milhares de insetos zunindo e rondando uma colmeia podem dar a impressão de que algo caótico está acontecendo por ali, mas a verdade é que cada um daqueles indivíduos está exatamente onde deveria. Abelhas passam os dias trabalhando, produzindo e armazenado mel para quando o inverno chegar. As tarefas entre estas operárias são divididas conforme a idade e a capacidade de cada uma. São vários times: há as que alimentam as larvas, as que constroem favos em hexágonos perfeitos, as que protegem o ninho e as que voam longe para coletar néctar e pólen de milhares de flores por dia. Para que o mel fique com a consistência certa, densa, é preciso aumentar a temperatura da colmeia e fazer a água evaporar, o que as abelhas conseguem ao bater as asas todas ao mesmo tempo. É um trabalho apuradíssimo de cooperação e organização, que deixa qualquer gestor de humanos boquiaberto com a capacidade de comunicação da equipe. 

A mensagem desses insetos é clara: uma abelha sozinha jamais faria mel. Juntas, elas formam um espírito coletivo que atua como um único ser. Não pode haver melhor metáfora para o cooperativismo. Como se a mágica da produção de mel não bastasse, as abelhas também recebem o crédito por polinizar mais de 80% das espécies vegetais no planeta, incluindo as lavouras. Ao voar de flor em flor em busca de alimento, elas transferem o pólen das estruturas masculinas para as femininas e garantem a manutenção das espécies. Um trabalho quase microscópico que sustenta e coopera com toda a vida no planeta. 

O ecossistema de uma floresta pode ser a grande inspiração para a gestão de um esquema cooperativista, de liderança coletiva, que use os recursos sem desperdício, com sustento disponível a todos os seres do sistema. A natureza, que se estabeleceu no planeta milhões de anos antes de nós, já solucionou nossos problemas há muito tempo.

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CEO de cooperativa de crédito, autor de livros sobre cooperativismo e Influenciador Coop do Sistema OCB.

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