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Propostas diversificadas para inovar na educação superior

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Formação mais sintonizada com as demandas atuais da sociedade é âncora de mudanças nas IES (foto: acervo Sapienza)

Por Geraldo Campos, CEO da Sapienza, e Luciano Bitencourt, jornalista.

Quando escreveu sobre universidades fantasmas e a educação 4.0 há cerca de cinco anos, o CEO da Sapienza, Geraldo Campos, explorava uma preocupação muito presente na gestão de Instituições de Ensino Superior brasileiras. Publicado como um artigo de ponto de vista no Linkedin, o texto aborda os desafios na entrega de valor para as demandas de formação em um mundo no qual as competências comportamentais e de liderança ganham maior peso.

Apresentar uma “carteira de aprendizagem”, como sugere Geraldo, ao invés de um diploma em uma entrevista de trabalho ainda parece uma possibilidade distante. Seja pela formação conteudista e linear característica da maioria dos programas de aprendizagem, seja pela cultura do próprio mundo do trabalho em avaliar as competências mais pela certificação do que pela atuação. Ainda assim, o cenário educacional brasileiro tem se mobilizado na busca por soluções para qualificar a formação dos estudantes e gerar oportunidades de sustentabilidade institucional.

Na avaliação do CEO da Sapienza, empresa que vem ajudando a desenvolver competências em inovação, empreendedorismo e gestão de negócios desde 2008, as Instituições de Ensino Superior precisam promover o acesso ao conhecimento com mais flexibilidade, incentivar o uso de tecnologias digitais e estimular a interação com os setores produtivos, dando atenção aos contextos sociais e suas demandas, ou vão virar “instituições fantasma” antes de desaparecer.

Essa concepção inspira reflexões importantes para o futuro dessas instituições e dos modelos de aprendizagem que ainda vigoram nos ambientes educacionais. Qual o espaço para a inovação nesses ambientes? Que experiências impactam os processos de ensino e de aprendizagem? Qual o papel do empreendedorismo na formação dos estudantes hoje? Como os professores têm lidado com as demandas por formação baseada em competências cada vez menos técnicas?

Com base nas experiências que a Sapienza tem ajudado a desenhar, passamos a contar aqui histórias sobre propostas, projetos, ações e tendências de uma educação que visa o empreendedorismo e põe em prática inovações de impacto nos ambientes de ensino e aprendizagem. As versões descritas aqui procuram promover um diálogo entre os diferentes pontos de vista, em dimensões complementares que ajudam a perceber a diversidade de caminhos possíveis.

UMA GRANDE SALA DE AULA INVERTIDA

Ao tratar da elaboração de projetos de curso para a graduação, Ricardo Morais Pereira usa um argumento que tem tirado muitas instituições da zona de conforto. “O que foi exitoso até aqui, pode ser que amanhã não tenha validade”, enfatiza o Vice-Reitor recém-empossado do Centro Universitário do Sul de Minas para explicar as razões de mudanças profundas implantadas recentemente. Há um ano o UNIS vem rodando um modelo de projeto pedagógico descrita por ele como “uma grande sala de aula invertida”.

Ricardo Pereira, vice-reitor do UNIS (foto: acervo pessoal)

Foi necessário escutar os estudantes primeiro, entender quem eram e o que esperavam da instituição através de uma grande pesquisa. A inteligência curricular por trás do projeto “tem como principal objetivo entregar algo novo para o aluno, sem desconsiderar a necessidade de tornar a estrutura acadêmica mais leve”, fundamenta Ricardo. Em resumo, explica o Vice-Reitor, a proposta é potencializar os 40% de atividades à distância em cursos presenciais, como permitido pelo Ministério da Educação, para atender às demandas dos estudantes.

Basicamente, o acesso aos conteúdos de todas as unidades curriculares se dá em ferramentas digitais que subsidiam as atividades presenciais. Na sala de aula, a relação do estudante com a aprendizagem prioriza o desenvolvimento de competências e habilidades na solução de problemas. Além disso, cada semestre é dedicado a projetos extensionistas que estimulam a relação com a comunidade e o mercado, desenvolvendo habilidades para a cidadania e um perfil profissional mais sintonizado com as necessidades atuais do mundo do trabalho.

Toda a sustentação pedagógica da proposta foi elaborada a partir dos pilares da UNESCO para a educação, usados pela instituição para descrever momentos de aprendizagem em todos os cursos. “No momento ‘conhecer’, o aluno busca o conhecimento em nossas ferramentas digitais. No ‘fazer’, ele resgata o conteúdo com o apoio do professor e coloca a mão na massa. E no ‘ser e conviver’, ele desenvolve habilidades para viver bem socialmente”, destaca o vice-reitor.

A ousadia da proposta está em implantar o modelo em toda a graduação. Os projetos pedagógicos dos cursos em Varginha, no Sul de Minas, estão sendo reformulados com a ajuda da Sapienza, levando-se em conta o modelo já em implantação. Para Ricardo, que conduzia o projeto como Pró-Reitor de Graduação Presencial antes do novo cargo, era essencial adequar a estrutura diante dos desafios enfrentados pelo sistema educacional. Foi um processo de mudança “intenso, tinha que ser rápido para não perdermos o bonde da história e pela necessidade de deixar a instituição mais leve neste momento”.

EXTENSÃO COMO OPORTUNIDADE DE INOVAÇÃO

Inovar em sala de aula implica remover barreiras, criar novos espaços de discussão e solução de problemas, combinando diferentes saberes e estratégias, mas não depende necessariamente de mudanças estruturais que impactam em toda a instituição de uma só vez. O Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí, Unidavi, por exemplo, está adotando uma modelagem inovadora na unidade de Empreendedorismo para estudantes do curso de Medicina, em parceria com a Sapienza.

O programa de ensino apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação de Santa Catarina (Fapesc) consiste em trabalhar conceitos de empreendedorismo e desenvolver a capacidade analítica dos estudantes para identificar problemas, gerar novos projetos e propor soluções negociadas com os atores envolvidos de melhoria nas estruturas de saúde pública em municípios da região do Alto Vale do Itajaí, em Santa Catarina.

Charles Roberto Hasse e estudantes de medicina da Unidavi (foto: acervo pessoal)

Nesta proposta, “nós conseguimos perceber as oportunidades e os desafios que estas estruturas vivenciam. Investimos a energia e a motivação dos jovens estudantes de Medicina na perspectiva de contribuir para a formação deles mesmos, enquanto geramos benefícios para a sociedade regional”, avalia o professor Charles Roberto Hasse, Pró-reitor de Pesquisa, Extensão e Inovação da Unidavi e docente de Empreendedorismo.

O que tem impulsionado o projeto é o envolvimento dos estudantes em iniciativas para solucionar demandas comunitárias. Os resultados são promissores, mas não são imediatos. O que se tem até aqui é a evidência de que é possível “construir soluções, potencializar recursos existentes, proporcionar novas experiências de aprendizagem a todos os envolvidos, com reflexões profundas”, indica o Pró-reitor.

A replicação do modelo do Curso de Medicina da Unidavi tende a ser adotada institucionalmente “sem a mesma prescrição”, permitindo que cada área do conhecimento crie uma “roupagem própria”, de acordo com os desafios a serem enfrentados e do perfil que se deseja formar. Charles Hasse destaca, entretanto, que enxerga aqui uma excelente oportunidade para consolidar a curricularização da extensão nos cursos de graduação, uma exigência do Ministério da Educação desde o final de 2018. De acordo com as recentes diretrizes, no mínimo 10% das horas dedicadas pelos estudantes no seu percurso de formação devem estar vinculadas a processos de aprendizagem na relação com a sociedade e devem estar incluídas na carga horária dos cursos.

Por isso, projetos como este contribuem para tornar os “currículos mais competitivos, mais aderentes às demandas sociais e de mercado, mais atrativos para quem ingressa”, conclui o Pró-reitor, cuja trajetória nos últimos anos tem sido dedicada a dar resposta ao desafio de promover a inovação e o empreendedorismo, institucionalmente. O aspecto central no projeto da Medicina é a promoção de atitudes proativas para apresentar soluções que surgem do diálogo entre diferentes saberes e da conexão com as demandas do ambiente externo.

SUPERAR O MODELO CONTEUDISTA

Inovação e empreendedorismo são temas já recorrentes nas universidades. Mas, geralmente, “os estudantes não aplicam os conceitos, não põem em prática o que aprendem”, avalia Rafael Dutra, Coordenador de Pesquisa e Prestação de Serviços e também responsável pela Internacionalização do Centro Universitário da Católica Santa Catarina, em Joinville. E “eles não querem mais aulas tradicionais”.

O modelo conteudista e estruturado de forma linear ainda é um problema, na concepção de Rafael, que se replica nas avaliações dos cursos e das instituições de ensino, influenciando na forma como a mudança dos processos educacionais é direcionada. “Aplicar o conhecimento e levar respostas à comunidade é que traz retorno para a aprendizagem”, sustenta o professor que sempre procurou inserir a pesquisa aliada ao ensino na sala de aula.

Rafael Dutra, da Católica SC (foto: acervo pessoal)

Alterar o modelo de ensino nesse cenário, inverter a sala de aula para trazer mais participação dos estudantes e autonomia na aprendizagem, segundo ele, dá a falsa ideia de que há uma redução no trabalho do professor. “Mas é o inverso”, alerta. Além da mudança no planejamento, o conteúdo determinado nas disciplinas precisa ser ministrado, o que exige mais tempo de dedicação. Para promover novas experiências no currículo, a extensão pode ser uma alternativa, especialmente quando associada a processos de investigação.

Rafael coordena um projeto também aprovado na Fapesc em parceria com a Sapienza, de caráter extensionista e com pesquisa. O Biotech Católica consiste em uma incubadora de biotecnologia cuja função é capacitar professores, divulgar a importância da área e promover o desenvolvimento de projetos de estudantes, selecionados para pré-incubação. “A ideia é que os projetos saiam com a formalização do negócio pronta”, como forma de materializar a aprendizagem e dar respostas à comunidade.

PARCERIAS EXTERNAS COMO NECESSIDADE

Buscar parcerias fora do ambiente acadêmico tem se tornado uma boa solução para sedimentar projetos inovadores em instituições de ensino. Não só pelas possibilidades de financiamento para viabilizar ideias que ajudem a mobilizar a comunidade acadêmica, mas também pelo reconhecimento de iniciativas empreendedoras como extensão dos processos de formação e das políticas de educação institucionais.

Para a coordenadora de inovação e responsável pelo Núcleo de Inovação Tecnológica da Universidade do Vale do Itajaí (Uniinova), Janaina Lorenzi Tomio, amenizar os riscos inerentes aos processos de inovação depende de investimentos nem sempre disponíveis nas instituições de ensino, que precisam dar conta de muitos desafios na gestão. Hoje os eventos do Uniinova, por exemplo, “têm mais participação, a comunidade está mais envolvida e se construiu uma boa relação com o mercado”, explica Janaína.

Janaína Tomio (à esquerda) no 5° Prêmio Univali de Inovação (foto: Gabriele Gessner)

O Prêmio Univali de Inovação, uma das ações promovidas pela universidade e organizadas pelo Núcleo em parceria com a Sapienza, em cinco edições foi ganhando visibilidade e adesão por estimular o uso de ferramentas no desenvolvimento de negócios no ambiente acadêmico. Para se ter uma ideia, os 73 projetos inscritos na última edição representam 26 cursos de graduação, três cursos de pós-graduação e dois colégios de aplicação. Os números positivos mostram que “o trabalho durante esses últimos quatro anos está surtindo efeito e sensibilizando cada vez mais atores do ecossistema da universidade a participarem do Prêmio”, confirma Janaina.

Outros projetos são realizados pela Univali com a participação da Sapienza. Dentro da Central de Empreendedorismo, o Empreenduca, dois programas de pré-incubação se destacam, ambos abertos à comunidade acadêmica e a empreendedores de um modo geral: o Flux.us, 100% online, e o Lab de Impacto, focado em negócios na área ambiental. Além disso, inovação e empreendedorismo são temas de capacitação constante para os professores da instituição.

Hoje o Uniinova funciona como hub para conectar diferentes atores na geração de oportunidades. Constitui, como vários projetos desenvolvidos para entregar opções de ensino e aprendizagem diferenciados, um cenário bastante complexo. As iniciativas para dinamizar os processos de formação e qualificar, com sustentabilidade, novas propostas mostram que, apesar das diferenças, compartilham uma preocupação comum: encontrar caminhos alternativos aos que trouxeram a educação até aqui.

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