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7 coisas que aprendi sobre RH em 7 anos empreendendo

Foto: divulgação.

Por Bruno Rodrigues, CEO da GoGood.

No último mês, comemorei 7 anos de construção da GoGood, a jornada mais prazerosa e desafiadora da minha vida profissional. Levantar do zero uma empresa de tecnologia em recursos humanos no Brasil faz com que essa experiência seja repleta de aprendizados. 

Como uma empresa de um benefício inovador, aprendi que na verdade o que importa são as pessoas do outro lado da mesa. Nesse caso, os RHs que contratam – ou não – a solução. Então, não existe inovação relevante sem o entendimento do seu cliente. 

Aqui, não pretendo trazer verdades absolutas, mas pontos de vista desenvolvidos através de milhares de interações, além de percepções consolidadas a partir do que testemunhei junto a clientes, ex-clientes, prospects, colaboradores e colegas de jornada – como outras HR Techs, mentores e investidores.

Neste artigo, compartilho os sete principais aprendizados sobre essa área apaixonante e enlouquecedora. 

1. Os melhores RHs buscam o protagonismo

Por mais crescente que a área seja, ainda é incomum ver RHs com voz e orçamento. A tendência natural dos C-Level é relegar ao RH papéis mais táticos e operacionais, enquanto proliferam uma visão que a prioridade são as pessoas.

Romper com o “escanteamento organizacional” é uma das principais capacidades dos melhores RHs que conheci. Essas pessoas entenderam que o assento estratégico e o orçamento proporcional ao tamanho da cadeira são mais conquistados do que cedidos. 

Durante os últimos anos, foram incontáveis as reclamações de RHs sobre diretorias pouco orientadas para pessoas. E compactuo com a maioria delas. Porém, também vi pessoas de RH que, com consistência e posicionamento ativo, ajudaram a diretoria a entender o papel e a representatividade do RH, assumindo posições mais estratégicas.

Isto é, RHs estratégicos também dependem da atitude de seus profissionais. Necessitam se inconformar unicamente com papéis de apoio e pouco orçamento, e mostrar que a empresa ganha com RHs mais relevantes, além de gerar bons resultados ao negócio através de investimentos em Pessoas.

Ainda sobre orçamento, esse assunto é sempre polêmico. Para driblar a discussão interna, os RHs buscam fazer milagres com orçamentos incompatíveis com a dimensão da área. Aprecio a mentalidade “vamos começar pequeno” ou “o que dá para fazer sem investir? Porém, via de regra, esse modus operandi faz com que o RH tenha entregas de baixa qualidade, perpetuando uma visão de área pouco relevante.

É necessário mostrar que o RH é a alavanca para os objetivos estratégicos da companhia – portanto, merecem e necessitam de investimento. 

Como CEO de um benefício inovador, acompanhei profissionais cheios de boas intenções que não tinham o protagonismo necessário para construir cases com a alta diretoria.

Essas pessoas enxergavam uma boa ideia, mas não possuíam força interna para reivindicar orçamentos e fazer acontecer. 

No extremo, vimos outras áreas assumindo recursos e iniciativas de RH unicamente por serem mais relevantes para aquela organização. Observamos decisões sobre benefícios e plataformas de feedbacks  vindas de áreas de operação e comercial, por exemplo. 

É comum ver RHs seguindo o ritmo de outras áreas, quando poderiam setar a agenda da companhia no tema de Pessoas. 

Numa breve correção do título deste tópico, eu diria que não apenas os melhores RHs buscam o protagonismo, mas que os melhores profissionais buscam o protagonismo. Acontece que outras áreas possuem essa importância por padrão na mente da diretoria. O RH precisa construir.

2. RHs são cobrados mas recebem menos recursos 

Aqui, também existe uma ligação com o inconformismo e quero convidá-los à reflexão. 

Muito se fala sobre a necessidade da existência de um RH estratégico e ligado aos objetivos da companhia. Porém, quanto investimento a área de gestão de Pessoas recebe? Como isso se compara a outras áreas?

É necessário atentar-se para questões desde o tamanho da equipe até a quantidade de horas da diretoria que são dedicadas ao tema de Pessoas. Será mesmo que os RHs têm os recursos necessários?

Comparando com outras áreas, o RH tem uma cobrança desproporcional aos recursos alocados. É essa assimetria entre demanda e importância – tempo, energia e recursos financeiros, que deve ser questionada.

Como comentei no primeiro tópico, cabe ao RH não se acomodar com esse paradigma e buscar a criação desta relevância, mas também à diretoria refletir se as frases ditas à assessoria de imprensa sobre “Pessoas em primeiro lugar” estão condizentes com os investimentos de tempo e recursos. 

Quero reforçar aqui também a visão de investimento de tempo no tema, não apenas de recursos financeiros. Posso dizer com confiança que conheci mais CEOs que atuavam melhor “da porta para fora” do que “da porta para dentro”. 

Isto é, CEOs que possuem agendas institucionais e vão muito bem fazendo o papel de representar a empresa publicamente, mas que investem pouco tempo olhando para a operação e para as Pessoas. Nesse contexto, RHs que não possuem o patrocínio interno do C-Level têm muito mais dificuldade para construir relevância.

Uma estrutura disfuncional para a criação de recursos é quando a diretoria de RH responde para o CFO (Chief Financial Officer). Infelizmente ainda muito comum, esse modo de operação ganhou representatividade nos últimos anos de crise devido à alta dos juros e a COVID-19.

Notem que o polêmico assunto de orçamento em RH geralmente é atribuído de forma vaga ao “momento da empresa”, “cultura organizacional” e entre outros motivos. Mas geralmente é um fator que se explica por estruturas e processos, além da atitude do RH e do CEO. 

3. Cultura, CEOs e RHs: responsabilidades que deveriam ser complementares, mas podem ser conflitantes

Provavelmente ninguém discordaria se eu defendesse a importância dos CEOs para a cultura organizacional. De fato, o C-Level é determinante na formação, fortalecimento e execução da cultura.

Entretanto, o papel do RH nesse tema ainda é visto de forma muito heterogênea no mercado.

Por ser o CEO de uma empresa de tecnologia em RH (uma HRTech), acompanho relatos tanto de CEOs quanto de líderes de RH que evidenciam os conflitos nesse tema. 

Nas últimas semanas, mediei em um evento uma conversa entre um CEO e uma Diretora de RH sobre a importância da gestão de recursos humanos nas diferentes fases de empresas de tecnologia. Ali ficou evidente o nível de conflito de visões que existe entre CEO e RH na prática. 

Percebi que existem expectativas de ambos os lados sobre o outro que não são atendidas, por exemplo:

RHs buscando contribuir tecnicamente para a formação da cultura e demandando mais intencionalidade e protagonismo do CEO no tema; e CEO exigindo mais entendimento sobre o negócio e suas prioridades para o RH. No fim, surge um abismo entre as duas visões sobre cultura.

Nesse aspecto, precisamos superar o paradigma de RHs que são excessivamente protetivos dos colaboradores e CEOs que olham demais para produtividade e longas horas de trabalho.

Também acompanho há meses ótimas diretoras de RH que me confidenciaram ter perdido a paixão pelo trabalho, isso por conta de mudanças na postura dos CEOs nos momentos de crise. Vários CEOs “people first” passaram a ser muito exigentes nas relações humanas em busca da eficiência de capital.

Na prática, vi empresas que possuem tanta discrepância entre visões, que o RH virou um “redutor de danos” da fala dos CEOs. Ou seja, toda vez que acontece uma manifestação pública do CEO gerando um barulho maior, o RH age para dizer que não era bem isso e que estava tudo bem.

Obviamente esse desalinhamento é insustentável e penaliza o negócio. 

Para me aprofundar no diagnóstico, vejo que existe um paradoxo: CEOs que declaram que a cultura é de sua responsabilidade, mas dedicam perto de 10% do seu tempo no assunto; e RHs que declaram ser estratégicos, mas dedicam 10% de seu tempo para entender os reais desafios do negócio.

Assim como a tendência humana de atribuir a si os méritos de qualquer vitória e a terceiros a responsabilidade dos insucessos, o C-Level comemora culturas fortes e culpabiliza terceiros quando a cultura é fraca, especialmente o RH. Isto é, no melhor dos casos o RH é um apoio do sucesso dos CEOs e no pior é responsável pelo insucesso da cultura.

Nesse contexto, ainda existem poucos CEOs verdadeiramente preocupados com a cultura, técnicos o suficiente para executar ações relacionadas e dedicadas – tempo e energia – à cultura organizacional.

Resumindo, acredito que o problema maior na falta de alinhamento de papéis entre CEO e RH na cultura da companhia é a dificuldade de desenvolvimento de uma visão em comum e entender como a estratégia de Pessoas pode ajudar a acelerar a concretização dessa visão.

Se nós – CEOs – conseguíssemos sentar na mesma sala que o RH e aumentar o tempo dedicado sobre visão, estratégia e negócios, conseguiríamos ter um RH mais protagonista. Além de intencional na busca pela seleção e desenvolvimento de talentos aderentes com a necessidade do negócio.

Enquanto não fizermos isso, todos se sentirão vítimas – o RH de um CEO que só pensa em Negócios e o CEO de um RH que só pensa nas Pessoas.

4. RHs agem em grupo

Poderia chamar este tópico de “O poder do benchmark” para deixar mais bonito, mas o fato que descobri é: RHs preferem replicar soluções já validadas em outros contextos do que experimentar, inovar e assumir o risco de ser o primeiro a fazer algo. 

Você dirá que o ser humano é assim, prefere não inovar para evitar riscos e eu concordarei com você. Porém, quando falamos desse comportamento no RH, a minha preocupação é a falta de análise do contexto em que essa solução foi validada. Se serve para uma realidade x, não quer dizer que sirva para a realidade y.

Se uma determinada empresa cria ou contrata um benefício inovador e ele é bem sucedido, seus concorrentes também o contratam na sequência. Tudo isso para não perder a competitividade na atração e retenção de talentos, mas sem perceber que pode ser um investimento desnecessário ou desalinhado com a estratégia.

Esse contexto evidencia uma colaboração entre os RHs – o que é positivo, mas também escancara a dificuldade de fazer uma leitura específica do cenário e estratégias da empresa. Além disso, coloca de lado oportunidades, ameaças e o desenho específico da solução mais relevante para a empresa em questão.

Assim, surge o questionamento: será que as prioridades do RH e do negócio estão sempre alinhadas? Ou será que como RH assumimos a nossa dificuldade de discutir a estratégia da companhia e “compramos” a solução mais quente do mercado no momento?

Alguns anos atrás, fui mentorado por um grande executivo do Vale do Silício e ele me disse que soluções de RH demoram a ter seus primeiros clientes, mas crescem muito rapidamente depois dos primeiros. E que isso tem a ver com a forma como o RH compra. O dito “poder do benchmark”

5. Ainda existem RHs paternalistas, mas o espaço está reduzindo

Numa visão ultrapassada, os RHs eram vistos como a área que contrabalanceava a vontade de crescimento de uma empresa e o cuidado com os colaboradores. 

Então, funcionava como uma balança: empresas que extraíam muitos recursos – tempo e energia – das pessoas contavam com um RH fraco ou inexistente. Assim, o objetivo da área era diminuir o ímpeto de voracidade da empresa, cuidando das pessoas ao mesmo tempo.

Nesse contexto, criou-se a imagem de RHs paternalistas – aqueles que não olham necessariamente para o crescimento e objetivos da empresa, e sim para o cuidado com as pessoas de forma excessiva. 

Essa visão é ultrapassada e cada vez mais existe a necessidade de olhar para a estratégia da companhia, encontrando formas de acelerar e dar sustentabilidade ao atingimento dessas metas.

Ainda no passado, essas lideranças de RH entendiam que seu papel era apenas de criar ambientes de trabalho felizes. Ou seja, RHs bem sucedidos eram aqueles que enfeitavam as mesas nas datas comemorativas, entregavam mimos e eram bons ombros para reclamações.

Porém, em um mercado de trabalho cada vez mais competitivo e em busca por eficiência, é exigido que a gestão de RH esteja ao lado da diretoria, buscando metas e objetivos. E como especialistas no tema pessoas, são eles que levarão os colaboradores ao atingimento.

Notem que existe uma contradição: por mais que o RH seja o maior responsável pelo tema Pessoas, ele não é dono deste tema. A partir desse ponto vem a complexidade de gerar influência nas lideranças, formando multiplicadores da cultura organizacional.

Ao longo dos últimos anos, também tem acontecido a evolução da expectativa do C-Level sobre o papel dos RHs. Ou seja, esperam muito mais apoio no desenvolvimento de uma cultura forte, que verdadeiramente ajude a empresa a desempenhar melhor.

Intrinsecamente, formou-se um novo conflito entre novos gestores e RHs que protegem as massas da diretoria. Acompanhamos diversos casos de mudança na percepção do papel e perfil do RH, além de bons profissionais que não conseguiram atualizar sua abordagem e perderam relevância.

Assim, o perfil esperado pelos profissionais de recursos humanos mudou. Consistência estratégica, visão de negócio e influência são essenciais para chegar no resultado esperado. 

6. Treinar, desenvolver e fidelizar colaboradores deveria importar mais que recrutar

Nos últimos anos, um dos maiores erros das empresas foi a alta demanda por crescimento acelerado e não sustentável. Principalmente presente em empresas de tecnologia, acompanhamos um comportamento chamado de Blitzscaling – que valoriza velocidade ao invés de eficiência e qualidade.

A obra de título homônimo ao comportamento, tornou-se um livro de cabeceira e conta como as empresas do Vale do Silício captavam altos investimentos para crescer o quadro de funcionários rapidamente. Porém, sempre tolerando ineficiências que iriam se corrigir com o tempo de acordo com a crença.

Acompanhei empresas que precisaram quintuplicar o seu quadro de funcionários em um ano. Assim, os RHs tinham quase que exclusivamente prospectar, contratar e fazer onboarding de funcionários. Eram áreas de recrutamento e seleção que tinham desafios enormes. 

Contratar errado era parte do jogo. Nessa mesma época, vimos profissionais mudarem de emprego algumas vezes em pouco tempo. Essa movimentação se justificava pelo apetite de contratação rápida das empresas.

O resultado foi catastrófico: ciclos de lay off (desligamentos em massa), além de uma gigantesca quantidade de profissionais ineficientes e desconectados com a cultura organizacional da empresa.

Atualmente, em um mercado que demanda sustentabilidade, passou-se a olhar para o gargalo fundamental. Isto é, as pessoas não chegam bem treinadas por um sistema de educação defasado em relação às primeiras necessidades e práticas do mercado.

Então, é mais eficiente trazer pessoas com traços comportamentais (soft skills) mais aderentes à empresa e treinar a técnica (hard skills) do que o contrário. É necessário que as empresas sejam hubs de desenvolvimento dos profissionais. 

Hoje enxergo empresas muito mais conscientes sobre a necessidade de cuidar do recrutamento e seleção, além de providenciar e investir na capacitação dessas pessoas.

Nesse contexto, o recrutamento interno – ou seja, a priorização de pessoas com potencial para o preenchimento de vagas estratégicas e investir no desenvolvimento dessas pessoas para que elas consigam atingir seu potencial.

Empresas tradicionalmente conhecidas por uma cultura organizacional forte sempre privilegiaram para novos produtos e negócios pessoas formadas dentro da companhia para que houvesse manutenção daquela cultura.

Acredito que a maioria das empresas já enxerga a maior necessidade de investir na experiência e desenvolvimento dos profissionais, além da fidelização do colaborador. Isso muda o papel da empresa para desenvolvedora e não recrutadora.

7. A contabilidade é para o financeiro o que o departamento pessoal é para o RH

Até algumas décadas atrás, o departamento financeiro das empresas era responsável quase exclusivamente pela contabilidade. Ele nasceu da  necessidade de cumprir obrigações legais. Por exemplo, recolhimento de impostos, registros numéricos e controlar ativos, passivos e balanço patrimonial. 

Entretanto, o departamento de contabilidade não trabalhava a partir de uma visão estratégica, que emergiu com o departamento financeiro. 

Ao longo das últimas décadas, o CFO (Chief Financial Officer) cresceu e ganhou força por olhar para o planejamento financeiro, grandes oportunidades de otimização de custos e gestão de negócios, além da expansão para novos mercados. Não é exagero afirmar que hoje ele é o braço direito do CEO e queridinho dos acionistas.

Em síntese, essas demandas estratégicas surgiram a partir de demandas operacionais. E a mesma coisa vem acontecendo com o departamento pessoal e o RH!

Departamento pessoal existe por necessidade e legalidade. Entretanto, a demanda pela criação da área de recursos humanos é muito mais sobre estratégia de pessoas, engajamento, produtividade e evolução para novos modelos de negócios.

Assim, existe um paralelo quase direto entre o departamento de contabilidade e CFO, e o departamento pessoal e CHRO. 

Décadas atrás, quando o mercado ainda estava em transição,  dizer que o CFO teria o mesmo poder que CEOs dentro da organização seria loucura. Hoje, vemos que essa transição se acelerou bastante, mostrando que daqui a alguns anos CEOs, CFOs e CHROs deverão sentar na mesma mesa de alta relevância.

E espero pessoalmente ver mais CEOs vindos de áreas de RH.

Para encerrar…

Portanto, esses sete anos trouxeram muitas lições sobre o RH. Porém, o maior aprendizado foi compreender a importância de uma área que fosse relevante, estratégica e transformadora para organizações e para o mercado.

Acredito que os anos dourados do RH ainda nem começaram. Então, fico feliz de ver mais de um bilhão investido em empresas chamadas HR Techs (Tecnologia para Recursos Humanos). Isso evidencia a crença e apetite com o qual o mercado enxerga essa área transformadora.

Também acredito que esse potencial só será 100% preenchido quando tivermos uma maior clareza do C-Level sobre o verdadeiro papel dos RHs e do outro lado uma capacitação proporcional a expectativa do negócio sobre eles. 

Tenho certeza que nos próximos anos muitos outros aprendizados surgirão. Que sejam todos eles para valorizar negócios e pessoas que fazem a diferença!

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