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“Ninguém gera impacto positivo sozinha”: conheça Rosângela Menezes, fundadora da Awalé

Foto: divulgação.

Rosângela Menezes, mulher amazonense que mora em Florianópolis há 16 anos, formada em Física pela Universidade Federal do Amazonas e em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina. Há 3 anos está à frente da Awalé, uma edtech de impacto social que conecta mulheres negras e indígenas a projetos de marketing digital.

Ela participa de uma série de cinco entrevistas sobre a trajetória de empreendedores e profissionais que se destacam em suas carreiras que estou publicando aqui na coluna. Confira abaixo: 

Qual sua trajetória profissional?

Rosângela: Sou formada em Física e em Jornalismo, mas minha vida profissional foi construída dentro da sala de aula e em agências de marketing de Santa Catarina. Nelas, pude trabalhar com planejamento e produção de conteúdo, mas também descobri que era possível alinhar minhas habilidades analíticas e criativas para criar estratégias de marketing digital que entregasse valor para os clientes. Descobri, portanto, que minhas profissões não eram excludentes, mas sim complementares. Afinal, o mercado digital deve ser orientado a dados. Fundei a Awalé em 2021. Costumo dizer que nascemos na pandemia do desconforto das estatísticas de desemprego da população negra, mas também do desgaste emocional que a crise de oxigênio em Manaus causou em mim. Eu queria fazer algo para além de doar dinheiro para as organizações do terceiro setor que estavam ajudando a população. Pedi demissão do meu emprego e utilizei meu conhecimento e minha rede de contatos para fundar a Awalé e colocar na rua nosso curso de conteúdo criativo e SEO. No mesmo ano, entrei para a lista de “Mindshifters: mentes que transformam”, conferido pela RD Station. Depois disso, várias empresas me procuraram para criar e executar estratégias de marketing digital e o que era meu projeto pessoal, acabou se tornando um negócio: oferecia serviços de marketing digital, como agência que chamamos de Awalé Digital, para fomentar o impacto social gerado com nossos treinamentos. Em 2022, passei pelo meu primeiro programa de aceleração, o Future Females Business School, em parceria com o UK-Brazil Tech Hub. Foi lá que me enxerguei como empreendedora e pude começar a pensar na Awalé como um negócio que gerasse impacto social e fosse lucrativo ao mesmo tempo. Já na aceleração Inpulso, fomentada pela Ambev e exclusiva para negócios de impacto, apresentei o pitch para nossas formações de média duração, o Awalé Lab. Ficamos em segundo lugar e conseguimos recursos para aumentar a equipe e lançar a Formação de Analista de Conteúdo, que acabou de capacitar 31 mulheres negras e indígenas com múltiplas habilidades para trabalhar com marketing digital. A Awalé me possibilitou palestrar na plenária do maior evento de marketing da América Latina, mas a minha métrica de sucesso é colocar minha carreira a serviço do meu propósito de compartilhar conhecimento e usar minha rede de contatos para aumentar o número de mulheres negras e indígenas trabalhando com marketing Digital. Em quase 3 anos, capacitamos cerca de 150 mulheres negras e indígenas, nas cinco regiões do Brasil. A maioria delas trabalha hoje com marketing digital e muitas já estão se preparando para se tornarem  líderes. E isso me enche de orgulho, porque não é mais possível viver em um mercado de trabalho onde somos a minoria, ainda que sejamos a maioria no ensino superior.

O que te fez escolher essa profissão?

Rosângela: Escolhi a física como profissão porque queria mudar o mundo: aprender sobre fenômenos, contribuir para os avanços na energia limpa, na recuperação de áreas degradadas e inspirar mais mulheres a entrarem para a ciência. Pude viver um pouco deste propósito nos quase 10 anos em que estive na Física. Contudo, não consegui administrar a discriminação e estereótipo de gênero que as mulheres enfrentam, sobretudo enquanto mulher negra. Decidi, portanto, fazer uma transição de carreira para o jornalismo para trabalhar com divulgação científica. Embora esse objetivo não seja cumprido, considero que alcancei a minha meta de gerar impacto positivo por meio da educação. Hoje, além de trabalhar focada em quatro das ODS da Onu: educação de qualidade, trabalho descente e crescimento econômico e redução das desigualdades, principalmente a ODS 10.2 que se refere a igualdade racial; também trabalho para aumentar a representatividade de meninas e mulheres na tecnologia por meio de mentorias, palestras e participação de painéis sobre o tema.

Quais são os principais aprendizados da sua trajetória?

Rosângela: Gostaria de ter tido contato com os textos de Angela Davis sobre autocuidado quando fundei a Awalé. Para ela, antes de mudar o mundo é preciso aprender a cuidar de si, pois essa prática também fortalece o coletivo. Nós, mulheres, somos conhecidas na sociedade pela dupla ou tripla jornada, principalmente pelo trabalho invisível de cuidar de outras pessoas. Temos dificuldade de pedir ajuda e muitas vezes estamos tão sobrecarregadas que não conseguimos compartilhar esse sentimento com outras mulheres. Em minha jornada, aprendi que ninguém gera impacto positivo sozinha e que é necessário muita troca com outras empreendedoras para não desistir no meio caminho. Dificilmente, um desafio é inédito, compartilhar essas vulnerabilidades e se abrir para receber dicas e feedbacks é uma oportunidade de seguir no empreendedorismo. Outro ponto que gosto de destacar, principalmente quando se trabalha com impacto social, é no que se refere à sustentabilidade do negócio. É importante gerar impacto, mas esse impacto só será escalado se a empresa tiver um fluxo de caixa positivo.  

O que você ainda almeja conquistar?

Rosângela: Ter acesso a mais fontes de financiamento e investidores para escalar a transformação que a Awalé vem fazendo nesses três anos. Com recursos próprios, conseguimos capacitar mais de 100 mulheres que conseguiram aumentar suas rendas familiares entre R$ 300 e R$ 4 mil reais. Quando uma mulher negra e indígena se movimenta e tem acesso a novas oportunidades, não estamos falando apenas de uma mulher que deu um salto de assistente de marketing para analista pleno. Estamos falando de uma família que vai ter segurança alimentar, vai ter acesso a novos espaços educacionais, vai ao médio prazo aumentar o número de mulheres negras e indígenas em cargos de liderança e isso vai inspirando novas gerações e construindo novos futuros. O trabalho que estou à frente na Awalé vai reverberar em muitas gerações e gostaria de seguir oferecendo formações gratuitas para que mais e mais mulheres negras e indígenas possam construir carreiras prósperas.

Quais hábitos você mantém para ter mais qualidade de vida no âmbito profissional?

Rosângela: O que garante a qualidade de vida no âmbito profissional são os cuidados que mantenho em minha rotina. Na verdade, não acredito nesta separação entre vida pessoal e profissional. Os dados de saúde mental corroboram com essa premissa, já que, segundo a OMS, o Brasil lidera o ranking de ansiedade no mundo e é considerado o segundo país com mais diagnósticos de síndrome do burnout. Para chegar o mais perto possível do equilíbrio, faço atividades físicas regularmente e, aos finais de semana, gosto de praticar caminhadas e corridas ao ar livre. Também cuido da minha alimentação e organizo a minha rotina de trabalho e familiar para que eu possa ter noites tranquilas de sono. No segundo ano da Awalé tive um burnout e desde lá tenho buscado formas de manter minha saúde em dia: descansar sem culpa, pedir ajuda e manter os exames em dia já são grandes passos para uma rotina de bem-estar. É como nos disse Audre Lorde: “cuidar de mim não é autoindulgência, é autopreservação, e isso é um ato de guerra política”.

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Fundadora do Economia SC, 3 vezes TOP 10 Imprensa do Startup Awards e TOP 50 dos + Admirados da Imprensa em Economia, Negócios e Finanças.

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