A reforma tributária está implementando um sistema dual de tributação sobre o valor agregado no país, composto pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência dos estados e dos municípios, e pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência da União Federal.
Tanto pela natureza indireta da tributação sobre o valor agregado quanto pela previsão expressa no artigo 37, inciso II, do Projeto de Lei Complementar nº 68/2024 (em tramitação no Congresso Nacional), esses novos tributos seguirão provavelmente a sistemática de repetição de indébito do artigo 166 do Código Tributário Nacional.
Isso significa que apenas os contribuintes que comprovem ter recebido autorização expressa de seus clientes poderão pedir de volta valores indevidamente cobrados pelo fisco. A criação de ferramentas tecnológicas que assegurem essa anuência dos consumidores no ato da compra será fundamental para assegurar a recuperação de tributos pagos indevidamente e exigirá capacidade de investimento por parte dos contribuintes.
Para que se tenha uma ideia do impacto dessa alteração, a conhecida “tese do século” (exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS), responsável pela devolução de mais de duzentos bilhões de reais às empresas, teria virado pó caso a restituição de valores aos contribuintes pelo fisco fosse condicionada à comprovação exigida pelo art. 166, do CTN. Com essa medida, o fisco pretende se blindar contra reflexos financeiros de abusos eventualmente cometidos, por ele próprio, na nova tributação sobre o consumo.
Se a reforma tributária será realmente tão simples e clara quanto divulgado pelo governo, ele deveria ser o primeiro a assumir a restituição de qualquer desajuste. Isso daria tranquilidade e confiança aos contribuintes. Mas o caminho escolhido parece ter sido o contrário. O dispositivo que restringe a devolução dos tributos pagos indevidamente poderá, infelizmente, acabar estimulando o exercício abusivo das competências tributárias, que são limitadas pela Constituição Federal.