Nos últimos anos, a palavra inovação se tornou uma das mais utilizadas — e, por muitas vezes, mal interpretada, no mundo dos negócios. Startups, grandes empresas, instituições públicas, universidades, associações e até escolas fazem questão de se rotular como inovadoras. No entanto, há um fenômeno crescente e preocupante no cenário contemporâneo: o dos pseudoinovadores.
Em meados de 2017 – quase 10 anos atrás – o ambiente de inovação e empreendedorismo como conhecemos hoje estava em fase inicial no Brasil; e, nos meus estudos de Doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento, na Universidade Federal de Santa Catarina – um dos cursos melhores avaliados do Brasil, na temática interdisciplinar – tive contato com o termo “Pseudoinovadores”, quando da elaboração de minha Tese de Doutorado, que versou sobre a Criação de um Modelo de Compartilhamento do Conhecimento para Ambientes de Inovação”.
Mas vamos ao tema do texto.
Segundo Vladimír Bureš – o criador do termo, por que este termo não é meu; e, é sempre preciso, necessário e legal dar crédito para os criadores – em seu livro Cultural Barriers in Knowledge Sharing (2023), ele introduz o conceito de “pseudoinovadores” como uma das barreiras culturais que dificultam o compartilhamento de conhecimento nas organizações e a inovação.
Para o autor, os “pseudoinovadores” são indivíduos que apresentam suas opiniões como melhorias indispensáveis sobre ideias ou propostas de outros, com o objetivo de destacar sua própria importância e indispensabilidade. Essas pessoas tendem a se apropriar de contribuições alheias, metodologias, conhecimentos, estratégias e soluções, reformulando-as levemente para parecerem originais, o que pode minar a confiança e desmotivar outras pessoas a atuarem junto ao ecossistema.
No dia-a-dia assumem o discurso da inovação, mas não entregam, de fato, algo novo, relevante ou transformador. Usam jargões pós-modernos, repetem termos como “disruptivo”, “exponencial”, “inteligência artificial”, “transformação digital”, “valuation”, usam expressões em Língua Inglesa, criam novas expressões que ninguém entende, mas suas ações são apenas incrementais, superficiais ou, em alguns casos, puro marketing. Estão sempre processando, criando, desenvolvendo, ou ainda está em MVP. É um eterno tem, mas na verdade não tem.
Na prática, vendem a ideia de inovação sem investir em conhecimento consistentes e científico, sem pesquisa, sem promover mudanças estruturais, sem escuta ativa dos usuários, sem método e sem compromisso com a resolução de problemas reais.
Mas, como podemos identificar os “pseudoinovadores”? Não é muito difícil. Estão em todos os ambientes, em todas as áreas do conhecimento e segmentos de mercado, mas algumas características distintivas podem ser citadas, como:
- Anunciam soluções antes mesmo de entender os problemas; e, geralmente são soluções mirabolantes e sedutoras.
- Realizam eventos chamativos, mas com pouco conteúdo técnico ou aplicação real, muitas vezes trazendo experiências sem evidências ou levantando exemplos de realizações que foram desenvolvidas por outras pessoas, em territórios que não são o seu.
- Apropriam-se de tendências sem adaptá-las ao contexto local ou ao usuário final, já que entendem que tudo serve para todo mundo. E, sabemos que isto não se aplica.
- Usam premiações e selos como “provas de inovação”, mesmo que os resultados não tenham impacto comprovado. Mas, o que vale é a foto no Instagram.
- Não validam suas ideias no mercado e evitam métricas que possam revelar ineficácia. E, muitas vezes tentam criar negócios, não conseguem avançar e se tornam mentores, trazendo o discurso de que quebrar muitos negócios é sinônimo de sucesso. Ensinam o que não conseguiram fazer. E por fim, se o seu negócio não foi bem sucedido, foi por falta de esforço.
A questão toda é que estes “pseudoinovadores” – de Instagram ou não – geram grandes impactos aos ambientes de negócios e ecossistemas. Geram um ambiente de desconfiança e competição interna, onde as pessoas hesitam em compartilhar informações por medo de terem suas ideias apropriadas ou desvalorizadas. Isso compromete a eficácia da gestão do conhecimento e pode limitar a inovação genuína dentro da organização e no território, causando alguns prejuízos, como:
- Descredibilização do conceito de inovação: Quando tudo é inovação, nada é inovação. O uso indiscriminado e vazio do termo gera ceticismo em investidores, parceiros e até no público geral.
- Deslocamento de recursos: Iniciativas que apenas aparentam inovar, mas recebem visibilidade e financiamento, deslocam recursos que poderiam ser destinados a soluções reais com potencial de impacto.
- Obstáculo à colaboração verdadeira: Pseudoinovadores tendem a operar com foco em autopromoção, não em colaboração. Isso mina relações de confiança e prejudica a construção de redes sólidas entre os atores do ecossistema.
- Desestímulo aos inovadores autênticos: Startups, pesquisadores e empreendedores comprometidos com a transformação real enfrentam mais dificuldade em se destacar quando o espaço está poluído por promessas vazias.
Mas como superar estas barreiras?
Para mitigar os efeitos dos pseudoinovadores, Bureš sugere a implementação de práticas que promovam a confiança e o reconhecimento adequado das contribuições individuais. Isso inclui sistemas de incentivo transparentes, cultura organizacional que valorize a colaboração e mecanismos que assegurem o crédito devido a cada colaborador pelas suas ideias e soluções, que podem ser:
- Valorizar a inovação com evidências: Propor métricas claras de impacto, adoção e transformação para avaliar iniciativas inovadoras, e gerar relatórios que demonstrem os resultados reais.
- Incentivar a educação empreendedora e científica: Desenvolver a capacidade crítica dos atores para identificar o que é inovação real e o que é apenas ruído.É preciso estudar a fundo os conceitos. Não se refere a ser teórico ou prático. Não existe prática sem teoria. A falta de conhecimento gera a falta de consciência, tornando a prática vazia.
- Criar políticas de fomento com critérios rigorosos: Garantir que editais, fundos e programas priorizem a inovação validada, com foco em impacto e escalabilidade, usando o conhecimento científico, frameworks e ferramentas de mensuração, para reduzir a subjetividade.
- Dar voz aos usuários e às comunidades: Inovações verdadeiras partem da escuta ativa e da co-construção com quem será impactado.
Inovação não é um rótulo, é um processo. Exige escuta, coragem para errar, método para validar e compromisso com a transformação. O futuro da inovação depende de quem está disposto a ir além do discurso e transformar realidades.