Search

Majoração do IOF: as últimas gambiarras fiscais

Foto: divulgação.

Nos últimos dias de maio, o governo federal promoveu alterações no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) que abalaram o mercado. Os Decretos nº 12.466/25 e 12.467/25 buscaram ampliar a arrecadação do IOF para fazer frente ao desajuste das contas públicas.

A utilização de decreto para majorar um tributo extrafiscal revela não só a falta de articulação junto ao Congresso para aumentar a arrecadação por meio de lei, como a adoção de um caminho sujeito a vários questionamentos jurídicos.

Uma das alterações mais controversas recai sobre os planos VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre). Antes não sujeitos ao tributo, os aportes de VGBL superiores a R$ 50 mil mensais passaram a ser tributados em 5%. No entanto, é importante ter em conta que esses aportes representam mera realocação de recursos — recursos estes já submetidos à tributação prévia, ao menos pelo imposto de renda. Ausente qualquer fundamento regulatório, a recente medida abocanha 5% de todo o principal investido, revelando inusitada tributação (confiscatória) sobre o patrimônio.

Mas não para por aí: o custo do crédito também foi fortemente impactado. Para empresas em geral, a alíquota anual do IOF subiu de 1,88% para 3,95%; no Simples Nacional, operações de até R$ 30 mil passaram de 0,88% para 1,95% ao ano; e as cooperativas de crédito com operações acima de R$ 100 milhões, antes não sujeitas ao tributo, agora também são tributadas em 3,95%. Essa majoração generalizada afeta diretamente a liquidez das empresas e compromete investimentos produtivos, contrariando o estímulo à atividade econômica de que o país tanto necessita.

O decreto ainda incluiu como operação de crédito sujeita ao IOF a antecipação de pagamentos a fornecedores — prática conhecida como “risco sacado” ou “forfait”. Ou seja, temos agora uma nova hipótese de incidência estabelecida por meio de decreto sem respaldo em lei específica, o que penaliza o fustigado setor produtivo.

No câmbio, a alíquota de 3,5% foi instituída sobre empréstimos externos de curto prazo, que antes eram isentos, e foi uniformizada também para operações com cartão de crédito internacional e remessas ao exterior. Houve, ainda, uma tentativa de tributar fundos e remessas de pessoas físicas ao exterior, mas o segundo decreto retirou essa medida poucas horas após a publicação do primeiro decreto.

Se o IOF estava a caminho de ser drasticamente reduzido até 2029, como parte do processo de adesão do Brasil à OCDE, os decretos representam um retrocesso na política econômica internacional do país. A quebra da expectativa em relação à redução do IOF e o aumento repentino da carga tributária geraram insegurança jurídica e têm afetado drasticamente a confiança de investidores.

Na verdade, a repercussão foi tão negativa que levou o tema de volta à mesa da equipe econômica do Governo, que reconsiderou alguns pontos. Porém, o recente recuo anunciado pelo Ministério da Fazenda é tímido e não resolve o problema em sua origem.

Ainda que em patamar inferior ao inicialmente determinado, o IOF continuará sendo majorado por decreto, dissociado de qualquer finalidade extrafiscal. Mas, para compensar a “redução do aumento”, o Ministério da Fazenda agora cogita trocar uma controvérsia por várias outras, pois deseja limitar a compensação tributária, reduzir benefícios fiscais e tributar investimentos estratégicos até então isentos.

Em outras palavras, penalizam-se outros setores da economia para atenuar uma medida que sequer deveria ter sido cogitada. Ao cabo, serão introduzidos novos impasses sem que tenham sido adequadamente enfrentados os anteriores.

O resultado é inevitável: além de todos aqueles contribuintes inicialmente atingidos pelo aumento do IOF que já estão buscando meios de impedir essa majoração, os novos segmentos onerados também ficarão descontentes, o que levará a ainda mais contencioso fiscal e mais judicialização.

Todo esse imbróglio reforça, mais uma vez, a necessidade de se repensar o uso responsável dos instrumentos tributários no país. A economia precisa urgentemente de previsibilidade e de uma diminuição de carga tributária, e não de mais aumentos repentinos que acarretem litigância. Não há mais espaços para gambiarras fiscais.

Compartilhe

Sócio-fundador do escritório Rafael Pandolfo Advogados Associados, Doutor em Direito Tributário e coordenador técnico do programa Resgate-RS

Leia também