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Quando o brilho da apresentação ofusca a realidade da entrega

Rebeca Lins nunca teve medo de palco. Vinda do teatro, formada em Publicidade e apaixonada por inovação, ela tinha presença, carisma e uma capacidade impressionante de fazer as pessoas acreditarem em uma ideia — mesmo que a ideia ainda fosse só isso: uma ideia.

Após uma experiência frustrante tentando empreender com moda circular, decidiu mergulhar em um novo universo: o de saúde mental. Sua irmã havia enfrentado um episódio grave de burnout, e Rebeca percebeu a dificuldade de encontrar apoio psicológico acessível e humanizado. Foi aí que surgiu o insight: uma plataforma de triagem emocional que, com base em testes rápidos, conectaria o usuário ao melhor tipo de suporte psicológico — humano ou digital — em até 24 horas.

A proposta parecia forte. O nome era bom. O branding estava impecável. Rebeca sabia contar a história como ninguém. Em menos de dois meses, inscreveu-se em um programa de pré-aceleração e, em pouco tempo, foi convidada para apresentar seu pitch em um evento com investidores-anjo. Era a oportunidade que esperava.

O pitch foi uma aula de narrativa. Começou com uma estatística chocante, trouxe emoção com a história da irmã, mostrou o tamanho do mercado de saúde mental e terminou com uma call to action precisa:

“O mundo precisa de cuidado. Nós estamos construindo a ponte entre o sofrimento silencioso e a ajuda acessível.”

Aplausos. Sorrisos. Convites para conversar depois do evento.

Mas, nos bastidores, a pressão começou a aumentar. Um investidor pediu o roadmap da tecnologia. Outro quis falar com usuários. Um terceiro solicitou o fluxo real da triagem e da jornada do usuário.

E foi aí que a verdade ficou difícil de sustentar: a plataforma ainda era um protótipo estático. Não havia testes realizados. Não havia dados de uso. A jornada do usuário era uma hipótese, não uma experiência validada.

Rebeca se viu diante de um dilema: continuar alimentando a narrativa para manter o interesse dos investidores, ou ser transparente e admitir que ainda não havia nada funcional?

A resposta veio após uma conversa com uma psicóloga parceira, que fez uma pergunta direta:

“Você quer cuidar da saúde mental das pessoas… mentindo?”

A frase bateu como um golpe. Duro. Mas necessário.

No dia seguinte, Rebeca enviou um e-mail para os investidores interessados. Agradeceu o interesse, explicou em que estágio o projeto realmente estava e deixou claro:

“Se vocês quiserem construir isso comigo do zero, com ética e responsabilidade, eu topo. Se esperavam algo pronto, não sou eu quem pode entregar.”

Dois investidores saíram do radar. Um permaneceu. Hoje, é seu maior apoiador.

A plataforma, chamada Cuide.ai, ainda está em desenvolvimento. Mas agora caminha com clareza, verdade e uma base sólida de validações reais com usuários, terapeutas e clínicas populares. E Rebeca aprendeu, talvez da forma mais difícil, que um bom pitch não é sobre vender um sonho — é sobre comprometer-se com a entrega.

Aprendizados do episódio:

  • Um pitch poderoso pode abrir portas — mas o que mantém elas abertas é a consistência entre o que se promete e o que se entrega.
  • Investidores não investem só na ideia — investem na postura ética e no compromisso com a realidade.
  • A confiança de quem aposta em você se constrói com verdade, mesmo quando ela parece te deixar em desvantagem.

Na próxima temporada: temporada 2: sobreviver é um milagre. No primeiro episódio: “Ninguém comprou. E agora?” O que fazer quando o produto está no ar, mas o público não aparece?

Este episódio te tocou?  Compartilhe com alguém que está preparando um pitch. E lembre: vender uma visão é importante, mas ela precisa estar ancorada em verdade, porque quem investe em você, aposta no seu caráter tanto quanto na sua ideia.

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CEO da Sapienza.

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