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Startups imobiliárias: tecnologia redesenha tradicional setor da economia

Foto: divulgação

Por Celso Laurentino da Costa, advogado e consultor jurídico.

Durante décadas, o mercado imobiliário brasileiro se desenvolveu com base em uma estrutura marcada por cartórios, corretores, registros e visitas presenciais. O modelo funcionava, e ainda funciona, mas carrega um custo alto: morosidade, opacidade de informações e pouca eficiência. Nos últimos anos, porém, esse cenário começou a mudar, e o vetor dessa mudança atende por um nome específico: startups imobiliárias, ou, em linguagem global, proptechs (property technology).

Empresas como QuintoAndar, Loft, EmCasa, Yuca, Netspaces e tantas outras estão redesenhando o setor, criando soluções que vão além da intermediação digital. Elas automatizam processos, eliminam intermediários, oferecem crédito, fracionam ativos e criam modelos de negócio completamente novos dentro de uma estrutura antes dominada por grandes construtoras, incorporadoras e imobiliárias tradicionais.

O foco dessas empresas é resolver dores reais e conhecidas do setor, como a alta fricção nas transações, a dificuldade de acesso a crédito, a gestão ineficiente de ativos e, sobretudo, uma experiência de usuário antiquada. Algumas proptechs desenvolvem ferramentas para antecipar aluguéis ou permitir locações 100% digitais. Outras investem na tokenização de imóveis, criando ativos digitais que podem ser negociados em plataformas online, com baixo valor de entrada e liquidez superior. Há também quem se concentre em gestão patrimonial, condomínios inteligentes, compartilhamento de espaços e soluções para moradia por assinatura.

Por trás dessas inovações, há um modelo de negócio robusto, baseado em receita recorrente, escalabilidade, entrada de capital de risco e uma proposta de valor clara. Mas junto com a inovação vêm os desafios, muitos deles de natureza jurídica. Afinal, o mercado imobiliário é um dos mais regulados do país, com forte presença do Estado (por meio de registros públicos, tributos e exigências formais).

Isso significa que qualquer proptech precisa lidar, desde o início, com temas como segurança jurídica de contratos digitais, inclusive em locações e compras; regras de registro imobiliário, que ainda não dialogam bem com tecnologias como blockchain ou tokenização; regulação do crédito, especialmente para empresas que atuam como garantidoras ou financiadoras; gestão de dados pessoais, particularmente em plataformas que analisam crédito ou perfil dos usuários e constituição societária e planejamento tributário, indispensáveis em negócios com estrutura enxuta e alto volume de transações.

Esses aspectos, no entanto, não devem ser vistos como barreiras, mas como elementos estratégicos. A startup que compreende os limites legais do seu setor consegue crescer com mais segurança, evita conflitos com órgãos reguladores e transmite confiança ao mercado. Por isso, cada vez mais vemos proptechs estruturadas com apoio jurídico desde os primeiros rounds de captação, inclusive com cláusulas contratuais criadas sob medida para proteger investidores e usuários.

O que está em jogo é mais do que uma transformação digital. Trata-se de uma reorganização da cadeia de valor do setor imobiliário, com novos agentes assumindo funções que antes pertenciam a bancos, cartórios, imobiliárias e construtoras. E esse movimento não parece ter volta. O consumidor quer praticidade. O investidor quer liquidez. O empreendedor quer escala. E todos eles enxergam nas proptechs uma ponte possível entre o mercado tradicional e o futuro.

O Brasil, com sua burocracia complexa e carência habitacional latente, é terreno fértil para esse tipo de inovação. Ainda há muitos entraves, sem dúvidas, mas a velocidade com que essas empresas estão crescendo mostra que, quando tecnologia, capital e estratégia jurídica caminham juntos, o resultado costuma ser transformação real.

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