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O paradoxo do bem-estar

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Foto: divulgação

Nunca se falou tanto em saúde mental e bem-estar. O mercado de wellness movimenta hoje mais de 5,6 trilhões de dólares no mundo, crescendo em média 8,6% ao ano. São aplicativos de meditação, banheiras de gelo, soroterapia, treinos de alta intensidade, ervas milagrosas, protocolos de produtividade, tudo para nos transformar em super-humanos.

Mas, com tanto investimento, uma pergunta incômoda não sai da minha cabeça:
se temos tantas soluções, por que tem tanta gente surtando?

Os dados não deixam dúvidas. Nos últimos três anos, os casos de ansiedade, burnout e depressão aumentaram 25% no mundo, segundo a OMS. No Brasil, o suicídio cresceu quase 12% ao ano nesse período, e hoje é a segunda principal causa de morte entre jovens. Se wellness fosse realmente a resposta, essa curva deveria estar caindo — mas ela só sobe.

É aí que mora a contradição. Criamos uma indústria que, em vez de curar, explora nossas inseguranças (e o ego de algumas pessoas). Um mercado que muitas vezes nos convence de que temos problemas que talvez nem existissem — até que um coach de Instagram ou um influenciador de lifestyle aparece para “diagnosticar” e vender a solução. É um ciclo vicioso: mais comparação, mais cobrança, mais protocolos a seguir.

O resultado? Até o descanso virou KPI. Você acorda às 5h porque disseram que é o segredo do sucesso, mergulha na banheira de gelo porque disseram que melhora sua resiliência, repete mantras porque disseram que sem isso você não se acalma. A espontaneidade some. A leveza desaparece. E a vida vira um script pronto — sem espaço para o improviso, sem espaço para o humano.

Mas o que realmente gera conexão e bem-estar não é seguir uma cartilha. É ser verdadeiro, espontâneo, imperfeito. É criar laços reais, onde vulnerabilidade não é fraqueza, mas o que sustenta a confiança. É justamente nessa margem de imprevisibilidade — fora do script — que nascem a criatividade, a inovação e as melhores oportunidades.

E o que quase nunca aparece no feed, mas faz toda a diferença, é o óbvio: autoconhecimento sério. Não o que vem embalado em frases de efeito, mas o que se constrói no silêncio de uma terapia, no mergulho profundo consigo mesmo, com apoio de profissionais que sabem conduzir esse processo. É desconfortável, exige coragem, mas é aí que mora a verdadeira transformação.

O Setembro Amarelo está aí para nos lembrar de algo essencial: não é sobre parecer bem, mas sobre estar bem. E, se 90% dos casos de suicídio poderiam ser prevenidos com acolhimento e cuidado, talvez o maior ato de coragem hoje seja tirar a máscara da performance e escolher viver como somos — sem filtros, sem armaduras, sem protocolos impostos.

No fim, o bem-estar não nasce de receitas prontas, mas de algo simples e raro: paz em ser quem se é. E talvez seja essa a maré que precisamos aprender a remar.

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Empreendedor, advisor, investidor, palestrante, entusiasta de atividades outdoor e apaixonado pelo mar desde sempre.

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