Há uma contradição difícil de explicar no Brasil. Enquanto o cooperativismo se mostra há décadas como um dos motores mais consistentes de desenvolvimento econômico e social – gerando empregos, distribuindo renda e fortalecendo comunidades – ele ainda não ocupa um lugar central no debate público e nas estratégias de governo. É como se tivéssemos nas mãos uma ferramenta capaz de transformar realidades, mas insistíssemos em deixá-la esquecida no fundo da gaveta.
Os números falam por si. Um em cada oito habitantes do planeta participa de uma cooperativa. No Brasil, cerca de 10% da população está vinculada a esse modelo. Onde ele está presente, o desenvolvimento humano é maior, as desigualdades diminuem e a economia local ganha fôlego. Mesmo assim, seguimos tratando o cooperativismo como alternativa, quando ele deveria estar no centro do projeto de país.
Chegou a hora de virar essa chave. Se queremos um Brasil próspero e justo, precisamos transformar o cooperativismo em política pública de Estado. Isso não se faz apenas com discursos ou homenagens em datas comemorativas. Exige decisões concretas, e o poder público tem instrumentos para isso.
A seguir, enumero três caminhos práticos:
1. Inserir o cooperativismo no currículo escolar
Falar de cooperação não pode ser assunto apenas de adultos. Se quisermos cidadãos capazes de construir soluções coletivas, precisamos começar cedo. A inclusão dos princípios e práticas do cooperativismo no currículo da educação básica, de forma transversal ou como disciplina, é uma medida estruturante. Ela ajuda a formar pessoas mais solidárias, conscientes do poder da ação coletiva e preparadas para tomar decisões no futuro.
2. Criar programas públicos de fomento ao cooperativismo em setores estratégicos
Em vez de apenas incentivar a abertura de empresas, as políticas públicas podem oferecer capacitação, assessoria jurídica e linhas de crédito específicas para cooperativas. Agricultura familiar, energias renováveis, reciclagem e tecnologia são exemplos de áreas em que o modelo cooperativo pode gerar impacto direto e rápido. Apoiar o nascimento e a consolidação dessas organizações significa investir em soluções locais para problemas nacionais.
3. Implantar centros de educação e incubação cooperativista
A terceira ideia exige ousadia: criar, em parceria entre governos, universidades e o Sistema S, centros voltados à formação de lideranças cooperativas e ao desenvolvimento de novos empreendimentos cooperativos. Esses espaços funcionariam como escolas e incubadoras, unindo teoria e prática e oferecendo suporte técnico, jurídico e de gestão para grupos que queiram se organizar em cooperativas. É um investimento com alto retorno social, capaz de transformar ideias em negócios coletivos sólidos e sustentáveis.
Precisamos superar a visão de que desenvolvimento se faz apenas com incentivos a grandes empresas ou com programas assistencialistas. O cooperativismo prova todos os dias que há outro caminho. Um caminho em que a riqueza é compartilhada, a economia é mais resiliente e o crescimento chega onde as políticas tradicionais não alcançam.
Se essa ideia já se mostrou capaz de tanto, o que estamos esperando para colocá-la no centro das políticas públicas?