A Strava, uma das plataformas mais populares entre ciclistas e corredores, entrou com uma ação judicial contra a Garmin no Tribunal Distrital do Colorado, nos Estados Unidos, alegando violação de patentes relacionadas aos recursos de segments e heatmaps — duas das funcionalidades mais emblemáticas do universo fitness digital.
Na prática, a empresa busca uma liminar que impeça a Garmin de vender grande parte de sua atual linha de produtos com esses recursos, incluindo relógios das séries Forerunner, Fenix e Epix, além dos computadores de ciclismo Edge. O argumento é que a Garmin teria se apropriado de tecnologias protegidas e originalmente desenvolvidas pela Strava, incorporando-as em seu próprio ecossistema, o Garmin Connect.
Mas afinal, o que são essas tecnologias?
Os “segments” são trechos específicos de rotas — como uma subida, uma reta ou um percurso popular — criados pelos próprios usuários para comparar desempenhos entre atletas. Ao completar um segmento, o aplicativo registra o tempo e gera um ranking com base nas atividades de outros usuários, estimulando a competição saudável e a superação pessoal.
Já os “heatmaps”, ou mapas de calor, reúnem milhões de atividades e indicam as rotas mais percorridas em determinada região, formando uma visualização gráfica que mostra onde há maior concentração de treinos e deslocamentos. Essas funcionalidades combinam dados de geolocalização, performance e comportamento, tornando-se pilares do ecossistema de dados esportivos da Strava.
De acordo com o processo, a Strava afirma que a parceria firmada em 2015, por meio do Master Cooperation Agreement (MCA), previa apenas licenciamento limitado dos “Strava Live Segments” — permitindo à Garmin integrá-los aos seus dispositivos. Porém, segundo a denúncia, a Garmin teria ido além: utilizado o acesso concedido para estudar o funcionamento das ferramentas e criar versões próprias, quebrando o acordo e violando as patentes registradas entre 2011 e 2016.
Essas patentes, concedidas entre 2015 e 2017, descrevem sistemas para comparar o desempenho de atletas em trechos específicos e gerar mapas de calor com base nas rotas mais populares, recursos que tornaram a Strava referência mundial em dados esportivos.
O pedido da empresa inclui uma medida cautelar que impediria temporariamente a venda dos produtos da Garmin com funcionalidades semelhantes, sob o argumento de que uma reparação financeira “não seria suficiente para compensar o dano”.
O conflito marca uma virada nas relações entre duas gigantes do fitness digital, que por anos foram parceiras estratégicas. Enquanto a Strava consolidou sua força como plataforma de dados e comunidade global de atletas, a Garmin sempre se destacou pela precisão de seus dispositivos e pelo hardware de ponta.
Agora, a disputa evidencia um tema cada vez mais recorrente no ecossistema da inovação: até que ponto a cooperação tecnológica entre empresas pode se transformar em conflito quando os limites de uso de propriedade intelectual não estão claramente definidos — ou quando a fronteira entre integração e apropriação se torna tênue.
Mais do que uma batalha judicial, o caso Strava x Garmin reforça um alerta para o mercado: a importância de contratos sólidos e de uma estratégia jurídica ativa em inovação e propriedade intelectual. Afinal, no cenário atual, onde dados e algoritmos são ativos de valor, proteger — e respeitar — as fronteiras tecnológicas pode ser o fator decisivo entre o crescimento conjunto e a disputa nos tribunais.