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Sobre o tamanho das coisas que só percebemos quando voltam a nos tocar

Foto: divulgação.

A Lagoa da Conceição tinha uma quietude própria naquela manhã, uma espécie de silêncio que antecede encontros importantes e que só Florianópolis consegue produzir. Chegar ao encontro da Branded House, idealizada por Diogo Machado, na minha própria cidade trouxe uma camada de intimidade que eu não esperava. O lugar onde costumo buscar descanso se tornou, por dois dias, o centro de uma conversa que atravessa o país inteiro. E isso já dizia muito sobre o que estava por vir.

Há muito tempo eu não participava de um evento que realmente mexesse comigo. Não por falta de conteúdo, mas por falta de verdade. Por falta de profundidade. Por falta dessa sensação rara de que estamos diante de algo que não tenta nos impressionar, apenas nos provoca. No gramado à beira da lagoa, percebi que essa imersão seria diferente. Era possível sentir pelo ar que quem estava ali tinha feito o caminho todo para aprender e, sobretudo, para trocar.

Gente de diversos estados, empresas que movem 8% do PIB brasileiro, profissionais que carregam décadas de experiência e uma disposição generosa para construir coletivamente a visão do que serão as marcas deste país nos próximos anos.

O impacto disso tudo é difícil de descrever. Estar entre pessoas que moldam setores inteiros do Brasil é perceber simultaneamente duas coisas que parecem opostas, mas não são. De um lado, uma humildade inevitável diante da escala, porque existe algo de grandioso em ver a complexidade do país estampada em cada conversa. De outro, a sensação discreta e poderosa de que somos maiores do que achamos, porque também fazemos parte dessa construção. E esse equilíbrio entre pequenez e potência talvez tenha sido um dos maiores presentes daquele fim de semana.

Ver tanta gente grande reunida mostrou que, por mais que façamos parte desse movimento, ainda existe um mundo inteiro que precisamos aprender, lapidar e compreender. E, ao mesmo tempo, lembrou que já carregamos uma força que talvez nem percebamos no dia a dia.

Foi nesse cenário que o Alex Lima, uma das mentes mais incríveis do branding brasileiro, retomou a imagem que já tinha aparecido nos meus cadernos. O X. Ele explicou de forma limpa e profunda o que aquilo significava. De um lado, o que inspira. Do outro, o que sustenta. No centro, a identidade de uma marca quando as camadas de discurso são retiradas. Não se tratava de um símbolo gráfico, mas de uma estrutura interna, uma lógica que obriga qualquer marca a se olhar com honestidade e decidir se o que declara combina com o que entrega.

Um recorte do que anotei enquanto tudo acontecia.

Quando ele falou, senti quase um estalo, como se aquele X estivesse circulando dentro de mim há semanas e, finalmente, alguém tivesse encontrado a palavra certa para encaixar. Ali tive vontade de abrir meu bloco e revelar o que já tinha rascunhado. Segue um pouco do que rabisquei entre uma fala e outra, tentando acompanhar o ritmo das ideias que não paravam de atravessar a sala. Movimento. Promessa. Entrega. Legado. Quais batalhas valem a pena. O que custa caro e o que vale no tempo. Onde se encontra a fronteira entre criatividade e responsabilidade. Como se sustenta coerência em um país tão plural e tão desigual. Tudo isso estava ali, torto, escrito rápido, mas vivo.

Sprints e debates sobre o que é e o que não é distintividade, as tendências para 2026, o painel sobre o valor das marcas estratégicas, as conversas sobre autenticidade, improviso, pluralidade, métricas reais de percepção, Brasil profundo, comportamento, cultura, economia, tecnologia, tudo se costurava silenciosamente numa linha maior, como se o evento inteiro fosse, na verdade, um lembrete sobre maturidade. E maturidade, no branding, não é sobre brilho. É sobre compromisso.

Em vários momentos, eu me peguei observando a cena: pessoas que comandam marcas gigantes, discutindo de forma simples, sentadas no gramado, compartilhando fragilidades e certezas, trocando experiências que não caberiam em nenhuma apresentação. Era uma visão bonita. Um contraste muito claro entre a grandeza do que elas representam e a humanidade despretensiosa do que elas são. Uma combinação que parece rara nos ambientes de negócios e que me fez prestar atenção com um cuidado diferente.

A verdade é que a Branded House tem uma força difícil de explicar porque a potência dela é feita de encontros, e não de anúncios. A imersão funciona não pela estética, mas pela convivência; não pela teoria, mas pela presença; não pela metodologia, mas pela conexão que se forma quando pessoas de lugares tão distantes se encontram com a mesma intenção de construir algo relevante. Percebi ali que boa parte do valor do branding está menos no discurso e mais na capacidade de criar relações que transformem perspectivas.

Voltei para casa com um sentimento que não aparecia há muito tempo: o de que crescemos um pouco quando somos colocados diante de quem nos amplia. Aprendi mais do que consigo escrever e entendi, com uma clareza quase estranha, que marca não é o que dizemos, mas o que permanece quando todas as frases acabam. Talvez seja isso que faz a distintividade ser tão difícil e tão urgente. Ela exige repetição, coragem, consciência e um tipo de verdade que não se sustenta na superfície.

Uma foto do coletivo que tornou a experiência maior do que qualquer conteúdo. Florianópolis me recebeu de volta igual, mas eu já não era a mesma. E talvez seja essa a melhor medida de um bom evento.

No fim, tudo se resume a uma pergunta que ainda reverbera em mim: o que sua marca prova quando ninguém está olhando? É uma promessa e é a partir dela que o futuro começa.

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Head de marketing multicanal, professora e mentora de startups.

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