Diz o ditado que a simplicidade é o último grau de sofisticação. A nossa aguardada reforma tributária, seguindo essa ideia, elevou a “simplicidade” ao patamar de princípio constitucional. O problema é que, a menos de um mês do início da fase de transição, pairam dúvidas não só sobre a efetividade desse novo princípio tributário, mas também sobre a própria capacidade de a máquina rodar.
Faltam ferramentas, falta clareza e, principalmente, falta definir quem vai resolver os litígios quando eles, inevitavelmente, chegarem aos tribunais. Há meses espera-se uma proposta de emenda constitucional que resolva esse impasse – e, até agora, nada.
O cenário para 2026 desenha-se turbulento. Além dessa preocupante inércia no plano constitucional, há três “nós” principais que ainda precisam ser desatados no Congresso.
O primeiro é o atraso na publicação das leis complementares. A demora na aprovação do PLP nº 108/2024 é um banho de água fria no cronograma. Sem a lei sancionada ainda em 2025, o desequilíbrio institucional fica escancarado, fragilizando a gestão do IBS por Estados e Municípios. Para tentar tapar o buraco, a Receita Federal e o Comitê Gestor lançaram um comunicado orientando sobre as obrigações de 2026. Ou seja: a partir de 1º de janeiro, contribuintes terão de emitir notas com destaque de CBS e IBS, mesmo pisando em um terreno normativo movediço.
O segundo ponto é o próprio Comitê Gestor. Ele deveria ser o cérebro da operação do IBS, mas sua instalação segue provisória devido à queda de braço política entre a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e a Frente Nacional de Prefeitos (FNP). O risco aqui é claro: sem comando unificado, a regulamentação da CBS (federal) e do IBS (subnacional) pode se desencontrar. Tributos que nasceram para ser gêmeos univitelinos correm o risco de virar primos distantes.
O terceiro ponto — e aqui mora a maior controvérsia jurídica — é a “pegadinha” da transição. A dispensa do recolhimento financeiro dos novos tributos no ano que vem está condicionada à correta emissão dos documentos fiscais. A lógica é perversa: sob o pretexto de forçar a adaptação tecnológica sem cobrar o imposto, o sistema inverte a regra do jogo. Se o contribuinte errar na obrigação acessória (o seu “dever de colaboração com o fisco”), será punido com a cobrança do tributo principal. Na prática, o erro burocrático vira tributo, o que afronta a própria definição do Código Tributário Nacional.
O ano de 2026 será o teste de fogo. Se, em 2025, o fracasso legislativo foi pouco sentido, o impacto, no próximo ano, será na operação dos contribuintes. A urgência de dissipar essa névoa de incertezas nunca foi tão grande, porque, no fim do dia, quem paga a conta da falha de planejamento do Estado é a economia do país.
O sucesso da reforma depende de coordenação, cooperação e regras claras para todos. Depende, em síntese, de simplicidade. Mas, por enquanto, ela é apenas uma promessa na Constituição; falta, agora, construir um sistema que, no mínimo, pare em pé.