Pesquisar

Maxxing: a cultura da otimização total e o novo regime de identidade da Geração Z

Compartilhe

Foto: divulgação

Vivemos uma era em que até a espontaneidade precisa performar.

O chamado Maxxing, termo que se espalha entre jovens e fóruns digitais, descreve mais do que um comportamento: é uma mentalidade. Representa a crença de que tudo como o corpo, rotina, mente, aparência, produtividade e até afeto, podem e devem ser otimizado.

Essa cultura da maximização nasceu da fusão entre o capitalismo de atenção e a retórica da alta performance. A Geração Z cresceu em um ambiente de exposição constante, onde a própria identidade é medida por engajamento, métricas e algoritmos. O resultado é um deslocamento psicológico profundo: o “eu” deixa de ser uma experiência e passa a ser um projeto de gestão.

Nesse contexto, a vida não é vivida, é administrada.

O Maxxing é o ponto culminante de um longo processo de interiorização da lógica de mercado.
Se, nas gerações anteriores, o consumo era uma forma de status, hoje ele se tornou uma extensão da autoimagem funcional. Produtos e experiências são adquiridos não pelo prazer imediato, mas pela promessa de aumento de performance. A suplementação alimentar, o skincare, os cursos de desenvolvimento pessoal, os dispositivos de rastreamento de sono ou produtividade: todos são expressões de um mesmo desejo de controle.

O “eu” como plataforma em atualização constante

O que antes era um ideal de autenticidade deu lugar a uma ética da eficiência.
A identidade agora se comporta como uma startup: está sempre em versão beta, sempre em busca da próxima atualização.
Nesse ecossistema, o corpo e a mente tornam-se interfaces públicas. O físico é a prova de disciplina, o rosto é um ativo estético e o comportamento nas redes é o principal indicador de coerência narrativa.

A estética do Maxxing é visível nos submovimentos que proliferam online. O LooksMaxxing, por exemplo, incentiva jovens a aperfeiçoar cada traço facial, seja por meio de skincare intensivo, procedimentos estéticos ou microcirurgias. Já o GymMaxxing traduz a musculação em um ritual de moralidade, onde força e definição física equivalem a caráter e foco. O WealthMaxxing, por sua vez, converte a mentalidade empreendedora em performance estética, o sucesso financeiro precisa ser visível, calculado e compartilhável. Há ainda o SelfMaxxing, que reinterpreta o autodesenvolvimento como produto midiático: meditar, ler ou estudar são exibidos não como práticas de reflexão, mas como sinais públicos de autocontrole e competência emocional.

Em todos esses casos, há uma mensagem comum: melhore-se ou desapareça.
A estabilidade é percebida como fraqueza. O descanso, como desvio.
A lógica de crescimento infinito, que antes se aplicava às empresas, agora se aplica ao indivíduo.

A ansiedade de não estar no máximo

Esse processo produz um tipo específico de sofrimento contemporâneo: a ansiedade de não estar maximizando o próprio potencial.
Ela é alimentada por uma exposição constante a narrativas de sucesso e performance que parecem acessíveis a todos, mas que, na prática, são insustentáveis.
A Geração Z vive o paradoxo de possuir mais ferramentas de autodesenvolvimento do que qualquer outra, mas também uma das maiores taxas de ansiedade e depressão da história recente.

O Maxxing, nesse sentido, é tanto uma promessa de autonomia quanto uma nova forma de servidão.
Ele oferece a sensação de controle, mas transforma a autogestão em vigilância interna.
O sujeito se torna seu próprio gestor, seu próprio fiscal, seu próprio algoritmo.
O que se apresenta como liberdade é, na prática, uma forma sofisticada de coerção: é preciso ser eficiente o tempo todo.

A cultura da autoeficiência substitui a antiga cultura da autoestima.
Enquanto os millennials buscavam autenticidade e propósito, os jovens de hoje buscam sintonia com o algoritmo. O ideal não é ser diferente, mas ser otimizado, uma palavra que soa quase técnica, mas carrega um peso existencial.
Ser otimizado significa estar calibrado para agradar ao olhar coletivo, para permanecer visível e relevante.

O consumo como extensão da disciplina

No campo do consumo, o Maxxing redefine completamente a relação entre marcas e indivíduos.
As pessoas não compram mais apenas produtos; compram instrumentos para continuar seu processo de maximização. O ato de consumo torna-se um gesto moral, um marcador simbólico de compromisso consigo mesmo.

A indústria da saúde, do bem-estar e da produtividade percebeu isso rapidamente.
O suplemento alimentar, o smartwatch, o aplicativo de foco e a rotina matinal de um influenciador compartilham a mesma promessa: entregar ferramentas para a otimização.
O consumo, nesse contexto, deixa de ser compensação e se torna autossupervisão.

Essa é a mutação mais relevante da economia da atenção.
Antes, o marketing explorava o desejo. Agora, ele explora o culpado.
Culpado por não ser suficiente, por não ter rendido o bastante, por não ter mostrado o progresso esperado.
O Maxxing cria consumidores hiperconscientes, mas emocionalmente endividados com a própria imagem.

Promete libertação, mas o faz dentro de uma lógica de hipercontrole.
Quanto mais uma pessoa busca autonomia, mais se submete ao olhar avaliativo dos outros e, principalmente, ao seu próprio.
A vida se transforma num reality show silencioso em que o roteirista, o ator e o público são a mesma pessoa.

Essa vigilância não é imposta; é voluntária.
A geração que cresceu dentro das redes internalizou o algoritmo como um princípio moral.
É ele que define o que é relevante, o que é belo, o que é produtivo.
A busca por autenticidade se dissolve num jogo de calibragem constante, entre o desejo de ser único e o medo de ser invisível.

O papel das marcas e o desafio de humanizar a performance

Para empresas e comunicadores, o desafio é compreender esse novo sujeito sem reforçar o ciclo de exaustão que o alimenta.
Marcas que insistem em vender a imagem de perfeição ou de superação infinita estão condenadas à obsolescência.
A Geração Z não quer modelos; quer espelhos imperfeitos que reflitam a complexidade real da experiência humana.

Isso significa reposicionar o discurso de sucesso.
Não querem apenas promessas de resultados, é necessário oferecer contexto, ferramentas e sentido.
As marcas que entenderem o Maxxing de forma madura podem se posicionar como parceiras de processo, não como tutoras do desempenho.
Elas não precisam celebrar a falha, mas precisam reconhecer que o caminho importa tanto quanto o resultado.

Essa transição exige abandonar a retórica da excelência e adotar a linguagem da consistência.
Na era do Maxxing, quem comunica com honestidade e vulnerabilidade não perde autoridade, ganha relevância emocional.

Entre o potencial e o colapso

Toda cultura de excesso gera sua antítese.
O Maxxing, com sua estética do “máximo possível”, tende a provocar movimentos de contraposição. Já é possível observar o surgimento de narrativas que celebram o ócio, o descanso e o “desempenho sustentável”.
A estética da pausa começa a se tornar símbolo de autonomia: o direito de não precisar render o tempo todo.

Mas, até lá, o Maxxing continuará dominante, porque oferece algo que nenhuma outra ideologia contemporânea entrega: a ilusão de controle.
Ele permite que cada indivíduo acredite que pode se salvar sozinho, desde que trabalhe mais, gerencie mais, e publique o suficiente.

O futuro talvez pertença àqueles que conseguirem integrar performance e humanidade, eficiência e descanso, propósito e limite.
Porque o verdadeiro poder, neste novo século, talvez não esteja em maximizar, mas em saber parar antes de quebrar.

Compartilhe

CEO da Drin Inovação, TEDx speaker, mentor, conselheiro e Linkedin TOP Voice.

Leia também