Por Henrique Chiummo, advogado empresarial do escritório Flávio Pinheiro Neto Advogados
Comum entre os brasileiros, o contrato de gaveta é uma modalidade contratual que se restringe exclusivamente às duas partes que o assinam: o vendedor e o comprador. O termo leva este nome por ser um tipo de negociação que se mantém em sigilo, não sendo publicado ou divulgado à terceiros. Diferente de contratos firmados em órgãos oficiais, o contrato de gaveta tem seu teor baseado nas escolhas do proprietário e não em leis ou fundamentos legais.
A transação se tornou popular principalmente no mercado imobiliário, por ser uma alternativa menos burocrática e mais acessível. Acontece normalmente quando um comprador negocia junto a instituições financeiras a compra de um imóvel ou bem e depois repassa a compra para um terceiro, porém sem oficializar a transação, se mantendo proprietário de tal bem até a quitação das parcelas do financiamento. Essa prática também é realizada em posses de títulos, contratos de prestação de serviços, entre outros.
É importante entender, no entanto, que apesar de uma prática comum, os riscos de se aderir a esta modalidade são diversos, visto que a sustentação do contrato se dá unicamente pela confiança entre os envolvidos. A maior preocupação que se deve ter é a má fé, já que não há como comprovar a idoneidade dos negociantes. Pelo caráter confidencial, diversas fraudes podem ser cometidas, o que traz aborrecimentos ao comprador e uma longa batalha judicial. A falta de suporte jurídico para o estabelecimento de cláusulas que validam os direitos das partes também é um fator de preocupação. Algumas brechas podem ocasionar grandes perdas financeiras.
Infelizmente, os riscos são maiores do que se imagina. Dados da Associação Nacional de Mutuários apontam que 40% dos mais de 8,6 mil associados, por exemplo, enfrentam ações por contratos de gaveta. Destes, a maioria sendo por inadimplência no pagamento das parcelas. Apesar de informal, o contrato de gaveta não é considerado ilegal. O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) permite que o mecanismo possa ser levado a disputas judiciais a fim do cumprimento dos termos.
Algumas medidas de prevenção, como guardar recibos de pagamento, e-mails e comprovantes da negociação ou assuntos pertinentes, podem dar mais segurança ao contrato. Mas ainda assim, este não deve ser o recurso usual para negociações, visto que uma visão especialista é determinante para garantir o melhor cenário para os envolvidos. Reconhecer em cartório as assinaturas e documentos, de preferência por autenticidade, é essencial pois garante a veracidade das condições determinadas e também pode ser um meio para tornar o contrato legítimo.
Um último fator a ser observado, caso o contrato de gaveta seja o formato possível em uma negociação, é o apoio de assessoria jurídica para se redigir o documento. Além de estabelecer direitos e deveres, o contrato tem, afinal, a responsabilidade de assegurar aos envolvidos o mantimento das condições estabelecidas. Um dos motrizes de adversidades são as cláusulas genéricas e sem especificações que dão margem a se pleitear, futuramente, elementos não antes negociados. Isso torna o contrato um instrumento vulnerável à alegações judiciais com grandes riscos de condenação. Por isso não existem modelos prontos, cada negociação é única para suprir necessidades específicas e precisa passar por meticulosa construção para que nenhuma das partes seja lesada.