Por João Selarim, partner da Questum.
Valuation é sempre um tema que gera algum nível de discussão no universo de startups. Embora seja um assunto complexo, é comum que todo mundo acabe tendo que falar sobre em algum momento – normalmente, tentando puxar a “sardinha” para o seu lado.
Mas, afinal, por que vemos múltiplos das mais diversas grandezas? O que define um valuation? Tem diferença entre valuation de venture capital e M&A, afinal? Essas e outras dúvidas que escutamos com frequência falando com empreendedores aqui na Questum serão abordadas neste texto.
Diferenças na Avaliação de Startups: Venture Capital Vs M&A
Startups ouvem sobre investimento desde cedo. Mesmo quem não pretende captar acaba se deparando com o mínimo do racional do processo: preciso convencer um investidor que o meu negócio é promissor, pegar seu dinheiro e dar um percentual da minha startup a um valuation “x”.
Com frequência, mesmo sem compreensão de como a definição de valuation funciona, algumas empresas levantam rodadas usando múltiplos de suas receitas e conseguem crescer seus negócios.
Eventualmente, anos após a captação, aparece um potencial comprador para sua startup que já captou ao citado valuation “x”, e é comum que esse potencial comprador discorde do valuation estipulado nas rodadas de venture capital e há um motivo para isso.
Por que VCs e compradores avaliam startups de formas tão diferentes? Simples e direto: porque eles possuem objetivos diferentes com a sua empresa.
Objetivos de um VC
Quando um investidor decide aportar capital em troca de um percentual da startup, o que ele acredita, na verdade, é que sua startup tem capacidade de crescer muito nos próximos anos, fazendo com que o percentual dele, que hoje vale “x” reais, possa valer 10 ou 20 “x” em 5 anos – fazendo, assim, com que o risco tomado por ele seja devidamente recompensado.
Se o VC tentasse utilizar um fluxo de caixa descontado (metodologia muito utilizada para fazer valuation de empresas) da startup que está queimando dinheiro infinitamente, o resultado vai ser que sua startup não vale absolutamente nada e, portanto, ele deveria ficar com 99% dela e deixar os sócios brigando pelo 1%. Nesse cenário, não faria sentido para o empreendedor se manter no negócio (e nem para o investidor).
Mas, se a metodologia diz que “vale zero”, por que os VCs aceitam investir e atribuir um valor maior mesmo assim? Por algumas razões:
A primeira, é que existe uma diferença muito grande entre uma startup que não dá lucro agora (mas tem plena capacidade de virar lucrativa em algum momento) e uma startup que não consegue dar lucro em hipótese alguma. Pouca gente vai topar investir em uma empresa do segundo grupo – enquanto as do primeiro podem fazer muito sentido, visto que vão usar o capital para acelerar, ganhar mercado, ultrapassar a concorrência e, portanto, valer mais.
A segunda razão tem a ver com a forma como o fundo ganha dinheiro. Ele pode ganhar em um exit (a startup foi vendida e a parte dele foi comprada também – falarei mais adiante sobre M&A) ou em uma secundária (um fundo maior entra na operação, coloca um cash-in na sua empresa e limpa o cap table – dando, portanto, liquidez ao investidor, que já entrou pensando no momento que iria sair desde o dia 1).
Ou seja: se você continuar crescendo e captando, é possível que ele fique satisfeito com o retorno de uma secundária, recebendo um valor atrativo em relação ao % dele no negócio.
Objetivos de um comprador
Agora, quando olhamos para uma empresa que está comprando uma startup, ela dificilmente está comprando pensando em vender. Em linhas gerais, ela quer comprar porque o deal faz sentido pra ela. E o que é fazer sentido? Tem muito a ver com sinergia.
Algumas possibilidades de sinergia para exemplificar:
- Passar a ofertar o produto dela na base da startup comprada, aumentando significativamente as vendas;
- Ampliação de portfólio, possibilitando a união os produtos e serviços e passando a oferecer uma uma oferta de valor muito melhor;
- Redução de custos da startup em 15% com a integração; entre outras possibilidades.
Um ponto-chave é que a disposição a risco da corporação é muito menor: um fundo pode ter 9 startups que não deram o retorno esperado e uma que deu um super retorno, que “pagará” pelo fundo todo.
O comprador, por outro lado, não opera nessa dinâmica: deveria acertar em toda compra. Pense o seguinte: se eu adquirir uma empresa que não traz bons resultados, o que eu fiz, em outras palavras, foi fazer um mau uso dos recursos da minha empresa.
Portanto, parte da função do Head de M&A da empresa compradora é mitigar riscos nas aquisições – de modo que no cenário ideal, todas as aquisições tragam um bom retorno. E saber se a aquisição tem coerência ou não, passa por avaliar bem quanto a empresa vale (usando uma ou mais metodologias de valuation).
O que importa
A partir dessa lógica, fica mais fácil entender porque a mediana de múltiplo de receita em M&A de startup no Brasil é próxima a 3x – bem abaixo de alguns múltiplos praticados em investimento.
Portanto, se você cogita vender a sua empresa, saiba que o valuation da sua última rodada não vai importar muito para o Head de M&A do potencial comprador – mas seu crescimento, sua margem e sua capacidade de gerar caixa, sim.
Já para o investidor, que tem expectativas de um retorno no múltiplo do valuation acordado no momento do aporte, um M&A a múltiplo muito inferior interfere nos seus resultados. Portanto, se ele tiver direito de vetar uma venda por contrato, ele pode exercer.
Por isso, é sempre válido lembrar: no momento da captação, atente-se ao valuation, mas também ao objeto contratual que você está assinando. Conte com especialistas na sua jornada para evitar objeções futuras.