Uma aposta considerada a mais idiota da história corporativa virou um império de luxo, em 1961. Um jovem arquiteto de Toronto, Isadore Sharp – filho de um imigrante polonês judeu e dono de uma pequena construtora –, não tinha crédito, nem dinheiro, tinha amor pela construção e fazer algo diferente no setor hoteleiro: tratar hóspedes como pessoas, não como números.
Sharp foi rejeitado por todos os bancos, o terreno era ruim, em área degradada de Toronto. Mas três pessoas acreditaram nele e fizeram uma forma de investimento coletivo, família e amigos: Murray Koffler, Eddie Creed e seu pai, Max. Nasce o Four Seasons em 1961. Seu sucesso e expansão se deve a filosofia de “tratar os outros como você gostaria de ser tratado”. Em 1977, atrai como sócios Bill Gates e o Príncipe Al Waleed bin Talal, da Arábia Saudita, e o negócio passou a valer $ 3,8 bilhões (incluindo dívidas).
O crédito para construir e consequentemente, o funding imobiliário é um pouco disso, são importantíssimos na viabilização de projetos, tanto para incorporadoras, quanto por pessoas físicas, que entenderem como aproveitar essa oportunidade.
O velho e tradicional funding imobiliário é isso aí, mas no mercado tradicional funciona assim: todo banco, ao oferecer um financiamento para empresa, por exemplo, usa a prática para emprestar o seu dinheiro barato da poupança para outros cobrando caro. Com isso, somente instituições lucravam com esses empréstimos para o setor.
Contudo, a escassez de crédito bancário forjou uma geração de incorporadores que estruturou seu próprio modelo de funding (captação de recursos artesanal), sem o tratamento legal, segurança e transparência suficientes, mas usando o equivalente à tese de Sharp no modelo Four Seasons: “tratar os outros como você gostaria de ser tratado” – a confiança do cliente e investidor.
Agora, a tecnologia e a governança jurídica unem-se à confiança para levar essa estratégia para o país inteiro e aos investidores atentos.
O mercado imobiliário brasileiro está atravessando uma revolução silenciosa interessante para investidores e tomadores de recursos.
Longe dos grandes centros financeiros, um novo modelo de funding está redesenhando a forma como incorporadoras captam recursos — e ele está no Sul, em vários cases que construíram bilhões de VGV.
Durante anos, incorporadores regionais improvisaram captações diretas com investidores locais para tirar projetos do papel. Muitas obras ficavam pelo caminho, é verdade. Outras estruturaram governança jurídica adequada e esse improviso virou método.
Hoje, plataformas reguladas (digital assets) e escritórios especializados transformaram essas captações artesanais em estruturas profissionais, reguladas, seguras e transparentes e vão revolucionar o desenvolvimento imobiliário.
Quando os bancos recuaram, a desintermediação bancária avançou
A origem desse modelo está na escassez de crédito imobiliário. Desde 2021, os saques bilionários da poupança drenaram recursos do SBPE. Com juros altos, o crédito bancário se tornou caro e escasso — sobretudo para PMEs incorporadoras.
Enquanto grandes centros paralisaram projetos, cidades médias do Sul, Porto Alegre, Balneário Camboriú, Florianópolis e Joinville, criaram mecanismos alternativos: permutas inteligentes, sociedades de propósito específico (SPEs), club deals (clubes de investimento) e, mais recentemente, produtos de operações estruturadas com lastro imobiliário.
O resultado foi a democratização do acesso ao “tijolo” — um canal direto entre investidores locais e incorporadoras enxutas, que agora lideram um novo ciclo de crescimento.
De captar para construir a estruturar para captar
A lógica mudou. Se antes o objetivo era captar recursos para então construir, hoje a estruturação jurídica e tecnológica vem primeiro. O funding deixou de ser apenas um meio e passou a ser um produto em si.
O que acontece reflete uma tendência global: desintermediação financeira é o modelo que aproxima investidores e incorporadores, reduz custos, distribui riscos e aumenta eficiência e vem acompanhado do sistema regulatório dos órgãos competentes, como CVM e Banco Central.
Para captar sem bancos, incorporadoras estão adotando cinco pilares jurídicos estratégicos além da tecnologia: diagnóstico societário, due diligence regulatória, contrato-base adaptável, custódia de lastro e governança digital.
Muitas já criaram conselhos jurídico-regulatórios internos, responsáveis por aprovar operações, custodiar recursos e dar transparência aos investidores por meio de acesso eletrônico seguro em plataformas. É aqui que o investidor comum entra com segurança.
O próximo ciclo não virá dos bancos
Esses mecanismos evitam os erros fatais que marcaram o passado: ofertas irregulares, falta de lastro e insegurança na liquidação.
O novo ciclo do real estate não será impulsionado por crédito bancário, mas por fundings híbridos, mercados secundários digitais e plataformas reguladas que conectam capital de investidores qualificados, family offices e incorporadores estruturados.
Essa é a nova fronteira do capital imobiliário brasileiro.
E, mais uma vez, temos oportunidades no Sul.