Assisti recentemente um TED Talk antigo, mas atemporal e inspirador, de Lera Boroditsky (“How Language Shapes the Way We Think” ou “Como a linguagem molda a maneira que pensamos” em tradução livre).
Ela defende que a língua que falamos não é apenas um instrumento de comunicação, é uma lente que molda como percebemos o mundo.
Boroditsky apresenta exemplos concretos: há comunidades na Austrália que não dizem “esquerda” ou “direita”, usam direções absolutas (norte, sul, leste, oeste) para se orientar no espaço. Isso altera profundamente como seus falantes percebem o ambiente e mesmo a noção de tempo e direção de forma mais aprimorada.
Outro exemplo: para os idiomas português e espanhol, o sol é masculino e a lua é feminina, enquanto para o idioma alemão é o contrário e para o idioma inglês ambas palavras não possuem genero e isso afeta a forma como as percebemos e as descrevemos, tendencionando a relacionar características mais masculinas, femininas ou neutras.
“A beleza da diversidade linguística é que ela revela o quão engenhosa e flexível é a mente humana. Não inventamos um – mas 7.000 universos cognitivos”.
Esse poderoso argumento, de que cada idioma carrega uma “cosmovisão” distinta, está no cerne do que se convencionou chamar de Relatividade Linguística.
Mas vale esclarecer: segundo a versão defendida por Boroditsky e por muitos pesquisadores atuais, a língua não determina completamente o pensamento (determinismo forte), mas influencia como pensamos, percebemos e organizamos o mundo.
O impacto dessa visão no mundo dos negócios e nas relações internacionais
Quando empresas operam globalmente — com equipes distribuídas ou em parcerias com múltiplas culturas — a linguagem deixa de ser apenas um meio de transmitir mensagens: torna-se um fator estratégico. Eis por que:
- Percepção e tomada de decisões: Línguas diferentes destacam aspectos distintos da realidade, o que influencia como equipes atribuem responsabilidade, interpretam fatos e avaliam riscos.
- Comunicação intercultural: Tradução literal não basta — estruturas mentais distintas afetam como conceitos de tempo, compromisso e mudança são compreendidos em negociações globais.
- Inovação e diversidade cognitiva: Times multilíngues reúnem diferentes formas de perceber o mundo, o que amplia repertório e gera abordagens mais criativas para problemas complexos.
- Internacionalização mais estratégica: Adaptar não só o idioma, mas a lógica cultural por trás dele, fortalece posicionamento, relacionamento e expansão para novos mercados.
Porque esse tema importa para quem atua com internacionalização
Segundo Michelle Damasco Noronha, fundadora da iNGLÊS iNC, “a fala da Boroditsky reforça algo que observo diariamente no trabalho com empresas em fase de internacionalização: comunicação internacional não é apenas domínio técnico do inglês, é leitura de mundo. Cada idioma molda padrões de percepção que influenciam negociações, engajamento de equipes e posicionamento global. Reconhecer isso é transformar a linguagem em vantagem competitiva”.
Michelle ainda reforça que a preparação linguística precisa desenvolver consciência cultural, não só vocabulário e fluência. Compreender como diferentes culturas estruturam pensamento reduz ruídos, previne conflitos e acelera negociações.
Empresas que tratam a linguagem como ativo estratégico ampliam sua capacidade de criar conexões reais, comunicar valor e inovar globalmente.
Nossa cosmovisão
A leitura do mundo que carregamos, nossa cosmovisão, está profundamente entrelaçada à linguagem que usamos. Ao levar isso ao universo corporativo e internacional, transformamos o idioma em algo maior do que uma simples ferramenta: um ativo estratégico para expandir horizontes, construir parcerias e gerar inovação.
Convido os leitores a assistirem ao TED Talk de Lera Boroditsky (link aqui) e refletirem: quantas possibilidades de pensamento, comunicação e colaboração permanecem ocultas, simplesmente porque falamos em línguas diferentes?