Por Hermínio Gonçalves, Country Manager da SoftExpert.
No universo corporativo, o “longo prazo” encurtou. Se no passado os planejamentos semestrais eram a norma, hoje a velocidade das mudanças legislativas e tecnológicas comprime o horizonte estratégico. Nesse estado de adaptação contínua e acelerada, se manter atualizado com as tendências regulatórias é fundamental, ainda que seja desafiador. Para líderes de compliance, 2026 deverá ser o marco zero de uma nova era de governança. Ele será o ano em que grandes regulações globais, discutidas exaustivamente nos últimos meses, entram em vigor com força total, por exemplo. Isso exige uma maturidade de dados, tecnologia e processos que poucas organizações possuem hoje.
Ou seja: a conformidade deixou de ser um checklist operacional aplicado para evitar multas e se tornou um pilar de estratégia, reputação e acesso a novos mercados.
A Era da Inteligência Artificial
A adoção da Inteligência Artificial (IA) generativa transformou a produtividade, e esse processo deve tomar ainda mais força no futuro. Segundo a Gartner, 65% dos CMOs acreditam que os avanços em IA transformarão drasticamente seu papel nos próximos dois anos. Isso ocorre porque a IA permite executar tarefas, analisar documentos, automatizar processos e muito mais. Quando essa ferramenta é aplicada de forma correta, a manutenção da conformidade regulatória se torna mais fácil e eficaz, a economia de recursos (como tempo ou dinheiro) é maximizada e os riscos de sofrer penalidades e sanções legais são reduzidos.
Contudo, a lua de mel com a IA desregulada acabou. O EU AI Act (Lei de Inteligência Artificial da União Europeia) estabeleceu um cronograma rigoroso que culmina em agosto de 2026. Nesta data, a maioria das regras para sistemas de IA de alto risco entrará em vigor. Isso impactará diretamente empresas que utilizam IA em recursos humanos, infraestrutura crítica, pontuação de crédito e biometria, ou que exportam para a Europa. Para líderes de compliance, isso significa que não basta mais se perguntar “como a IA pode nos ajudar?”. A pergunta de 2026 será: “como garantirmos a governança no uso de IA?”. Assim, as empresas precisarão mapear onde a Inteligência Artificial está sendo usada e deverão classificá-la por nível de risco que apresentam. A “caixa preta” dos algoritmos não será mais tolerada. A explicabilidade das decisões tomadas por máquinas será mandatória para auditorias.
ESG presente do marketing à auditoria
Durante anos, muitas iniciativas de ESG (Environmental, Social, and Governance) viveram no terreno das intenções e do marketing. Em 2026, a conformidade climática e social será baseada em dados auditáveis, enterrando definitivamente o greenwashing. Dados da PwC revelam que, apesar das incertezas regulatórias, 66% das empresas aumentaram a quantidade de recursos dedicados a relatórios de sustentabilidade no último ano. O objetivo é se antecipar às exigências e, dessa forma, sair na frente da concorrência.
Assim, será essencial integrar os riscos climáticos aos riscos corporativos tradicionais – A gestão de sustentabilidade não pode mais viver em planilhas isoladas, ela precisa estar conectada ao ERP e ao sistema de GRC da companhia.
Resiliência cibernética e proteção de dados
Até pouco tempo, a segurança da informação focava quase exclusivamente na prevenção de ataques. O cenário para 2026 muda o eixo para a resiliência. A premissa é que o ataque ocorrerá; a questão é como (e quão rápido) sua empresa se recupera dele. Essa urgência é financeira e operacional: projeções da Cybersecurity Ventures indicam que o cibercrime custará ao mundo US$ 12,2 trilhões anualmente até 2031. Ao mesmo tempo, a lei DORA (Digital Operational Resilience Act), ainda que seja focada no setor financeiro europeu, traz reflexos globais e exige provas de recuperação.
A conformidade em cibersegurança exigirá testes de estresse reais, não apenas documentais. Certifique-se que sua infraestrutura de segurança seja robusta, ágil e com medidas de compliance digital contínuo.
Conformidade estratégica: compliance by design
Por fim, uma tendência comportamental forte para 2026 é a transição do compliance punitivo para o compliance ético e cultural. As regulações, como a Diretiva de Whistleblowing da UE, amadureceram a proteção ao denunciante, exigindo canais de denúncia que garantam anonimato real e não-retaliação. O motivo por trás de todo esse cuidado é claro: o custo da não conformidade nunca foi tão alto. As multas globais por não conformidade atingiram a marca de US$ 14 bilhões em 2024, impulsionadas pelo aumento do escrutínio regulatório.
Por isso, a conformidade estratégica deve ir além do canal de denúncias. Trata-se de adotar a mentalidade de Compliance by Design. Ou seja, em vez de criar um produto e depois verificar se ele está em conformidade com as principais normas e leis do setor, a ética e a regulação são incorporadas já no design do processo desde o primeiro dia. Empresas que falham em incutir essa cultura enfrentam o maior de todos os riscos: o reputacional.
Os potenciais de 2026
O próximo ano deverá marcar o fim das ferramentas estáticas. Diante de regulações que mudam semanalmente e normas que se atualizam, a gestão manual tornou-se um risco operacional inaceitável. Uma pesquisa da PwC mostra que 82% das empresas planejam investir mais em tecnologia para impulsionar as atividades de conformidade Ou seja, planilhas e trocas de e-mail, por exemplo, não oferecem a rastreabilidade, a segurança da informação ou a velocidade necessária para o cenário de 2026.
Olhar para 2026 pode parecer assustador diante da complexidade da sopa de letrinhas regulatória. No entanto, líderes disruptivos e preparados enxergam nisso uma oportunidade: empresas que se antecipam não apenas evitam sanções, mas operam com mais eficiência e transmitem maior confiança aos investidores. A convergência dessas tendências aponta para uma única direção: a necessidade de uma plataforma integrada. Gerenciar riscos, qualidade, ESG e privacidade em silos separados é uma estratégia falha que deverá ser punida como nunca no próximo ano.