Existe um instante entre o céu e a terra em que tudo parece suspenso.
Nem lá, nem cá.
Só o ar, o som baixo do motor e o pensamento se ajeitando no silêncio.
Nesse instante, o tempo muda de forma.
O que é urgente some, o que é essencial aparece.
E a gente entende que quase tudo o que pesa embaixo é leve aqui de cima.
Voar não é só deslocamento.
É uma pausa no meio da pressa.
Um lembrete de que não existe controle sobre o que sustenta o ar, e ainda assim, a gente confia.
Talvez por isso mexa tanto.
Porque lembra que o medo não é inimigo, é passagem.
E que coragem não é ausência de dúvida, é seguir mesmo tremendo.
De longe, a vida se mostra diferente.
As dores parecem menores, os planos parecem possíveis, os dias parecem novos de novo.
O mundo continua o mesmo, mas o olhar volta outro.
E quando o avião toca o chão, algo pousa dentro da gente também.
Um tipo de serenidade que não precisa de explicação.
Um reconhecimento mudo de que tudo passa, e que o que fica é o que se viveu com verdade.
O voo acaba, mas o ar continua em nós.
Como um lembrete suave de que há sempre altura possível, mesmo nos dias em que o horizonte some.