Por Marcos Assi e Roberta Volpato, autores do livro Compliance: como implementar
Tendo em vista as inúmeras incertezas relacionadas aos impactos e, principalmente, aos desdobramentos da pandemia do coronavírus em todo o mundo, as empresas, independentemente do porte, precisam avaliar seus processos de gestão baseadas em suas realidades, bem como seu apetite ao risco e objetivos estratégicos originalmente desenhados.
Portanto, para que o seu negócio ainda seja sustentável neste imenso desafio, a gestão de riscos tem papel relevante para manutenção de seus produtos e serviços, colaboradores e gestores, clientes, e por que não, para seus fornecedores, afinal, todos fazem parte de sua cadeia de valor.
Nesse sentido, visando que esse gerenciamento aconteça de modo adequado, devemos considerar os seguintes aspectos:
- Caso ainda não tenha estabelecido um comitê de gestão de crises, reunindo os principais executivos e gestores da organização diariamente (de preferência pela manhã), para reavaliações tempestivas dos avanços do coronavírus e seus impactos no negócio, já está mais que na hora.
- Construa um plano de gestão de crises, associado a um plano de recuperação e continuidade do negócio (incluindo possibilidades de desastres e/ou situações externas, para isso, citamos como exemplo a greve dos caminhoneiros).
- Se o plano já existe e a empresa o considera desatualizado, ou mesmo inapropriado para a crise atual, não vale se ocupar com uma atualização; ações rápidas, conscientes e coordenadas são a pedida do momento.
- Depois de superados os problemas, um grupo de trabalho de sua empresa, criado de modo multissetorial e liderado pelos membros da alta direção, deverá, através do debate sobre os aprendizados obtidos com o enfrentamento da crise, constatar as vulnerabilidades dos processos de gestão e controles internos, reconstruindo um novo, coerente e efetivo plano de gestão de crises.
- A mesma lógica deve ser adotada para a avaliação dos riscos do negócio: se isto ainda não faz parte da cultura da sua empresa, ou se a avaliação está há muito tempo desatualizada, agora não é o momento de se ocupar dela. Os aspectos estratégicos, operacionais, financeiros e regulatórios derivados da pandemia serão medidos apenas nas próximas semanas. Logo, qualquer esforço agora implicará retrabalho logo à frente. Na atual conjuntura, a organização deve se ocupar de “apagar incêndios” (sem deixar, é claro, de fazê-lo de forma coordenada, estratégica e mediante a reunião dos recursos humanos, financeiros e tecnológicos necessários), mas nada além disto. Os detalhes, já que não priorizados até o momento, postergue para o período de calmaria.
- Quando se fala em riscos, automaticamente pensamos em impactos. Caso a empresa, além de não ter avaliado previamente seus riscos inerentes, também não tenha mapeado e calculado os impactos à sua recuperação e continuidade, uma alternativa rápida e que pode servir para tentar salvar o negócio é a renegociação com bancos, clientes e fornecedores (especialmente, prazos e pagamentos), além da manutenção da execução dos serviços e realização de entregas (pois, do contrário, isto pode “matar” o seu negócio).
- Outra ferramenta rápida, que pode ser usada ainda que temporariamente para ajustar seu apetite e tolerância a risco, é a construção de indicadores de performance e riscos para monitoramento contínuo. Ele estabeleceria gatilhos para o acionamento de medidas de contingência e continuidade de forma minimamente estruturada.
- Durante as reuniões diárias obrigatórias que mencionamos no início, o seu comitê de gestão de crises deve discutir sobre o mapeamento de cenários (já ouviu falar de “stress testing”?). Estes momentos são essenciais para aprender com os problemas e desenvolver possíveis soluções, especialmente para o caso de prolongamento da crise, avaliando o apetite de risco e, o principal, qual a tolerância do negócio para essas situações.
- Finalmente, implemente mecanismos internos de comunicação para todos os seus stakeholders, realize o monitoramento dos avanços da pandemia, por meio de fontes seguras, e avalie quais serão os impactos nos negócios e na vida das partes interessadas. Esta comunicação deverá ser coesa e recorrente, realizada por porta-vozes especialmente escolhidos para esta finalidade, de forma que todas partes interessadas, dentro e fora da organização, tenham acesso ao mesmo conteúdo e ao mesmo tempo. Isto certamente evitará vazamentos de dados descontextualizados e, até mesmo, especulações promovidas por pessoas que não estão suficientemente inteiradas do contexto e dos planos de ação adotados pela organização, além de cenários de pânico e incerteza. Desta forma, todos estarão “na mesma página”, sabendo apenas o que for realmente útil, verdadeiro e necessário para que prossigam trabalhando de modo seguro e auxiliando a empresa no atingimento dos objetivos de seu plano de gestão de crises e continuidade dos negócios.
É provável que quando chegarmos ao fim da pandemia, as organizações que sobreviverem se deparem com algumas baixas e perdas, mas, esperamos que estes dados, mesmo negativos, não tenham destaque maior do que os aprendizados colhidos com o período.
E, para que os aprendizados façam sentido de verdade, revisite os processos de controles internos, compliance, gestão de riscos, gestão de crises e gestão da continuidade de negócios, jamais negligenciando a importância de se preocupar com a melhoria contínua e com correções que, se detectadas e implementadas imediatamente, garantirão valor agregado e perenidade.