Diariamente, tomamos inúmeras decisões de forma natural que costuram nossos hábitos e comportamentos todos os dias. Essa naturalidade é composta por todo o nosso histórico de vida já validado que nos mostrou um caminho previsível e seguro de tomar pequenas decisões diárias para sobreviver. Isso tudo acaba criando hábitos de decisões e é completamente normal que isso aconteça.
Decisões mais simples são bases para a criação de hábitos e decisões padronizadas que sustentam grande parte do nosso dia-a-dia. Uma vez que detenho de todas as informações que poderão influenciar na minha decisão, o fluxo torna-se orgânico e assim conseguimos avançar naturalmente. Ou seja, a diversidade é desnecessária.
Mas com problemas complexos, o raciocínio é diferente. Ninguém terá todas as informações relevantes e mesmo o indivíduo mais inteligente terá apenas um subconjunto de conhecimento disponível para usar. Para resolver um problema complexo você pode até saber muito sobre o contexto, mas não saberá sobre tudo.
Políticas públicas, por exemplo, é o que representa muito bem essa questão. Você pode até ter boas intenções com políticas fiscais e de distribuição de renda, mas se a equipe que estiver por trás dessas decisões não ter uma representação ampla do seu espaço problemático, então a solução dessas políticas atenderá parcialmente a população.
Nenhuma solução simplificada que virá de um grupo homogêneo resolverá qualquer problema complexo.
Para tentar facilitar essa compreensão, vamos tentar imaginar, juntos, uma ideia básica da ciência da diversidade a partir de um simples desenho. Imagine aí um retângulo. Esse retângulo representa o universo de ideias úteis que você poderia utilizar para resolver um problema complexo. Isto é, ideias, perspectivas, experiências e estilos de pensamento relevantes para um problema ou objetivo específico. Agora, pense em alguém para resolver esse problema complexo. Esse indivíduo é o mais inteligente que você conhece e está localizado em um dos cantos deste retângulo.
Ao posicionar este indivíduo dessa forma, teremos o risco de desenvolver um dos comportamentos mais comum neste contexto.
Imagine que, por uma visão estratégica e bem fundamentada, uma liderança resolve contratar os ‘indivíduos mais inteligentes’ possível para compor uma equipe para resolver este problema complexo. Apesar de todos serem profissionais excelentes e com conhecimentos impressionantes, a sobreposição desses talentos limitará o resultado do desafio. Ou seja, se todos sabem coisas similares e compartilham das mesas perspectivas, logo as conclusões tenderão a ser previsíveis e homogêneas.
Entendemos que é confortante ter pessoas que pensem como nós e nem sempre é culpa dos envolvidos. Suas bolhas, quando não conectadas, podem representar um fim em si mesmo e não gerar um valor ideal para a inteligência coletiva.
Pense como é reconfortante estar cercado por pessoas que pensam da mesma maneira, que reflitam nossas perspectivas e confirmam nossos preconceitos. Isso faz com que nos sintamos mais inteligentes. Valida nossa visão de mundo.
As evidências dos escâneres cerebrais indicam que, quando os outros espalham nossos pensamentos, os centros de prazer do cérebro são estimulados. Podemos dizer aqui que a homofilia é uma força gravitacional oculta, atraindo grupos humanos para um canto problemático do espaço.
O resultado disso representa uma realidade generalizada no mundo de hoje: grupos de pessoas individualmente inteligentes, mas coletivamente bem estúpidas.
E não se engane, a homofilia é generalizada. Nossas redes de contatos estão cheias de pessoas com experiências, visões e crenças semelhantes. Mesmo quando os grupos começam diversificados, a osmose social pode nivelá-los à medida que as pessoas convergem para as suposições dominantes, um fenômeno conhecido como “assimilação”.
A combinação das características cognitivas com as características demográficas individuais é, quando homogênea, fator limitante quando olhamos para a inteligência do coletivo. Observe, por exemplo, gabinetes públicos, escritórios de advocacia, equipes de liderança do exército, altos funcionários públicos e até executivos de empresas de tecnologia, todos passam por isso.
Constatar a homogeneidade desses grupos não é criticar os indivíduos; é notar que, quando indivíduos inteligentes têm referências sobrepostas, tornam-se coletivamente míopes.
Pois bem, como avançar nessa discussão?
Para tentarmos combater essa miopia coletiva, a ideia agora é usar o coletivo como forma de emergir um conhecimento ainda mais relevante para a resolução do problema complexo. O que eu estou querendo dizer aqui é que grupos sábios, portanto, têm uma dinâmica diferente. Eles não são homogêneos, clones um do outro. E é para essa combinação que precisamos olhar.
Eles não discordam apenas para discordar, mas trazem insights de diferentes regiões do espaço problemático. Esses grupos contêm pessoas com perspectivas que desafiam, ampliam, divergem e fazem polinização cruzada. Isso representa a marca da inteligência coletiva: como os conjuntos se tornam mais do que a soma de suas partes.
Para finalizar a ideia do retângulo que falei no início, trago aqui como ele ficaria a partir da combinação de vários indivíduos tão inteligentes quanto os indivíduos que já conhecemos, porém com níveis mais abrangentes de inteligência. Ao invés de todos estarem concentrados no mesmo canto do espaço, agora, todos se encontram algum local diferente do retângulo.
E aqui caiu a minha ficha sobre o entendimento de problemas complexos que, inclusive, me fez repensar a forma que lidava com tamanhos desafios.
Com isso, vou concluir aqui o texto olhando para a importância da inteligência coletiva de uma forma diferente. Antes de sair freneticamente investigando um problema da forma mais profunda possível, o ideal a ser feito é entender o que estamos deixando de considerar no entendimento deste problema. Perguntas como: quais as lacunas em nosso entendimento coletivo? Estamos cercados pela cegueira conceitual? A homofilia nos levou a um canto apertado do espaço do problema?
Examinar um problema, investigar cada vez mais a fundo tais dimensões é, na verdade, uma forma de reforçar os pontos cegos do desafio.
Ou seja, o primeiro passo para qualquer grupo enfrentar um desafio difícil, então, não é aprender mais sobre o problema em si e olhar profundamente suas várias dimensões. É sim, entender a cegueira de perspectiva e trazer as informações faltantes para o jogo.
Precisamos abordar a diversidade cognitiva antes de enfrentar os desafios. Só assim, a deliberação da equipe levará à iluminação, não ao espelhamento.