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A cultura da sua empresa pode ser tudo, menos invisível

Foto: divulgação.

Tenho mais de 10 anos de experiência no mundo do RH. Nos primeiros cinco, fundei uma consultoria focada em educação, na qual também trabalhava a cultura organizacional em alguns clientes.

Nos cinco anos seguintes, como gestor de uma grande empresa do mercado financeiro, liderei o time responsável por construir uma estratégia de cultura que atendesse aos objetivos da empresa.

E, em todos os diferentes cenários que enfrentei ao longo dessa caminhada, a cultura da empresa sempre foi o alvo das dificuldades que vivenciávamos.

Atire a primeira pedra quem nunca ouviu a seguinte frase: “É culpa da cultura.”

Pode ser a lentidão na tomada de decisão ou a liderança tóxica que insiste em não assumir os próprios erros, tem de tudo.

Qualquer coisa pode virar desculpa para terceirizar o problema. Mas em que isso ajuda a resolver o problema?

Aliás, se o problema é cultural, a culpa é tão sua quanto da pessoa para quem você está apontando o dedo — ainda mais se você não fizer a sua parte.

O desafio cultural de uma empresa está em todo lugar e pode ter diferentes camadas ou responsáveis. Mas ele não é, de forma alguma, invisível.

Pode-se dizer que cultura é algo complexo, sim. Porém, não invisível.

E, se ouvir a frase “é culpa da cultura” tem se tornado cada vez mais comum, é porque muitas lideranças a utilizam como seu escape pessoal. Líderes adoram recorrer à desculpa da cultura invisível para não assumir os próprios erros.

E assim fica fácil, né? Se tudo é um mistério e está colocado num único cesto, logo é difícil medir, gerir, mudar ou evoluir. Em outras palavras, é mais fácil jogar lenha na fogueira do senso comum e terceirizar o problema para o RH.

Contrata-se um workshop de cultura; faz-se um guia de cultura; compram-se comes e bebes todos os meses; mantém-se a mesa de sinuca e o Playstation na empresa; manda-se produzir uma camiseta com uma frase bonita e coloca-se todo mundo para usar.

A simplificação do problema gera ações superficiais. E longe de o RH ser o culpado nessa história, tá?

A meta não foi atingida? É culpa da cultura. A rotatividade está alta? O colaborador é que não tem o perfil da empresa. Horas extras acima do limite? Antes sofrer com ansiedade do que não parecer workaholic. A valorização interna não acontece? O que vem de fora é sempre melhor. A comunicação não é boa? Vamos encomendar mais uma campanha de comunicação.

São tantos os sinais que revelam as sombras de uma cultura que chamá-la de invisível soa até preguiçoso.

Tais sinais nem sempre são fáceis de combater, eu entendo. Mas o elefante branco está na sala — e precisa ser debatido. E o debate precisa gerar compromisso e responsabilização, incluindo as lideranças envolvidas, o RH e sua estratégia, além da conexão com os objetivos do negócio.

Sempre que afirmamos que é invisível ou incapaz de ser medida, reforçamos essa passividade nas pessoas.

O que acontece quando as equipes ficam sobrecarregadas? Há uma revisão do planejamento ou novas contratações? O que acontece quando as lideranças não conseguem alinhar os objetivos da empresa? Há um direcionamento da alta gestão ou contratam um workshop de comunicação não violenta? E quando há um desafio iminente no ar: as pessoas fogem do conflito? Evitam conversas corajosas? Há um endereçamento do problema ou apenas o deixam passar?

Essas e outras observações nos dizem mais sobre a cultura do que qualquer pesquisa de engajamento interno.

Em um artigo futuro, quero explorar possibilidades práticas de como minimizar o risco que as empresas correm ao não gerenciar os impactos de uma cultura disfuncional. Há inúmeras metodologias e modelos de gestão que apoiam essas análises. Mas, sim, há caminhos.

Antes de terminar, fica a minha recomendação: observe alguns dos sinais acima e veja a reação na sua organização. Essa reação trata o problema na origem ou vira uma ação superficial para a empresa “dizer que fez”?

Na maioria dos casos, os colaboradores são os que mais sabem falar sobre a cultura de uma organização — não a diretoria, nem quem está como CEO ou no conselho. O problema é quando essas duas pontas não se entendem. E esse já é outro sintoma de uma cultura pedindo socorro.

Precisamos sair do modo “cultura é algo que acontece” para assumir que “cultura é algo que gerenciamos”.

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Especialista em gente e gestão.

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