Tem sido cada vez mais comum ouvir de pessoas próximas que, segundo elas, o plano de carreira não funciona. Há quem diga estar desacreditado da estratégia, pois nunca viu um plano sequer dar certo.
Sendo eu um especialista em Gestão de Pessoas, responsável por projetos de desenvolvimento humano e de liderança, ouvir esse tipo de resistência me acende um alerta: qual é a origem dessa descrença?
Quando pergunto a essas pessoas, as respostas são vagas. Nem sempre são conclusivas e, muitas vezes, trazem ainda mais dúvidas a respeito da sua visão do que respostas concretas.
Mas eu não julgo tais pessoas. Tanto nos meus clientes quanto nos profissionais a quem apresento meus trabalhos, é perceptível que o histórico com planos de carreira não é dos melhores.
E arrisco a dizer que os motivos são os mais variados possíveis.
Por que as pessoas têm acreditado cada vez menos nos planos de carreira?
O plano de carreira é um artefato muito presente em qualquer tipo de cultura organizacional. Assim como um organograma ou uma tabela de cargos e salários, ele é feito para cumprir a previsibilidade corporativa, dando mais segurança para aqueles que buscam ascensão na empresa.
Na última coluna de Álvaro Machado Dias, na Folha, ele traz justamente esse ponto: a perspectiva da inteligência artificial como uma alternativa à ascensão tradicional de cargos nas empresas, principalmente ao questionar a necessidade de uma liderança intermediária — que fomenta muito mais a lógica de comando e controle do que a própria eficiência em si, de acordo com o autor.
O desafio é aprender com o cenário de carreira antigo, adaptar-se ao momento presente e preparar-se para o futuro. Se a IA poderá substituir a tomada de decisão intermediária, dando mais velocidade e quebrando os silos internos da instituição, quem se responsabilizará caso a decisão seja equivocada? Qual é o custo final da eficiência operacional?
Mas voltando ao plano de carreira
Sua credibilidade tem sido questionada, mas a conta final precisa ser dividida com outros fatores.
- Um plano de carreira não dá certo porque a empresa, ao apresentá-lo a um colaborador(a), muitas vezes não respeita os combinados até a sua consolidação. A falta de coerência entre discurso (meritocrático, de crescimento) e realidade (promoção por favoritismo, demissão sem justificativa clara, mudanças bruscas de estratégia) leva a um plano mal-sucedido.
- Um plano de carreira não dá certo porque organizações reestruturam áreas e cargos o tempo todo. O que era uma trilha ontem pode simplesmente deixar de existir amanhã.
- Um plano de carreira não dá certo porque há conflitos geracionais. Novos profissionais valorizam autonomia, aprendizado contínuo e flexibilidade mais do que estabilidade hierárquica.
- Um plano de carreira também não dá certo porque o colaborador(a) espera que a empresa faça tudo por ele. Ao mesmo tempo que soa paternalista e ultrapassado, esse comportamento diminui a elegibilidade da pessoa em oportunidades futuras.
- Um plano de carreira também não dá certo pelas instabilidades do mercado e pelas decisões estratégicas. Layoffs, fusões e cortes minam a confiança de que a empresa está comprometida com o crescimento de cada um.
Planos de carreira perderam credibilidade porque a vida real não cabe em organogramas: empresas mudam, cargos somem e as pessoas não querem mais trilhas prontas, mas sim liberdade para construir o próprio caminho.
E, claro: quando um plano de carreira não dá certo, é mais fácil julgar o protagonismo (ou a falta dele) do colaborador(a) do que corrigir um sistema corporativo cheio de disfunções.
Ou seja, não é apenas o plano de carreira em si que precisa ser questionado, mas sim o todo. O sistema não ajuda. As crenças das lideranças ainda vivem no século passado. O modelo hierárquico deixou de ser um desejo para muitos, mas ainda não se enxergam alternativas.
Mas talvez existam. O que ganha força no lugar disso são modelos mais flexíveis, que falam em possibilidades de desenvolvimento, experiências diversas e construção de carreira junto com — e não dentro de — uma empresa.
Modelos que passam pela gestão de performance alinhada a conversas constantes, por adaptações que respondem às mudanças organizacionais e que atendem aos desejos de ambos os lados.
Esse é o modelo de que falei neste post aqui.
Um olhar de desenvolvimento muito mais orientado ao futuro e ao talento da pessoa do que a uma visão de avaliação de resultados passados baseada em cenários que já não existem.
Quem sabe assim, somado a outros esforços, o plano de carreira volte a ser valorizado.