Empresas com perfil familiar são quase a totalidade dos negócios registrados no Brasil. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), elas representam 90% das empresas do país. Além disso, são responsáveis por mais da metade do Produto Interno Bruto brasileiro (PIB) e empregam 75% da mão de obra do Brasil.
E, além de todos os desafios que uma empresa enfrenta para se manter no mercado, as empresas familiares encaram, ainda, a necessidade de sucessão na liderança dos negócios. O Índice Global de Empresas Familiares, da PwC, mostra que apenas 24% dos membros da geração atual no comando das empresas familiares brasileiras têm um plano de sucessão robusto, o que deixa o processo ainda mais difícil quando, por algum motivo, ele precisa acontecer em um curto espaço de tempo.
Na construtora Castanhel, empresa fundada em 1980 por Edio Castanhel, em Criciúma, o processo de sucessão começou a ser desenvolvido há oito anos, quando o negócio vivia um bom momento e já tinha a credibilidade de 36 anos no mercado. Foi nessa época que Edio Castanhel Filho passou a acompanhar os passos do pai e a conhecer todos os setores da empresa, de maneira detalhada.
“Eu era atleta de tênis. Então, saí de casa aos 12 anos de idade por conta do esporte. O tênis me abriu inúmeras portas, me permitiu fazer faculdade nos Estados Unidos e, em seguida, tive a chance de trabalhar em empresas americanas e de ser trainee na maior empresa de shopping centers da América Latina. Enquanto isso, eu e meu pai sempre conversávamos sobre a empresa, apesar de eu não participar presencialmente dos negócios da família”, conta o filho.
Foi em uma visita à família em 2015 que ele e o pai começaram a conversar sobre a possibilidade de atuarem juntos frente ao negócio familiar, já pensando em uma sucessão futura.
“Após uma longa conversa, decidimos que eu passaria a atuar diretamente na construtora Castanhel. Num primeiro momento teria que me inteirar dos processos de uma forma geral. Seria uma espécie de ‘sombra’ do meu pai para, eventualmente, gerir a empresa toda. Combinamos que eu ficaria por três anos e, caso me adaptasse e fizesse sentido para ambas as partes, continuaria na empresa”, relembra.
Em agosto deste ano, esse processo completa 8 anos e, desde então, inúmeras melhorias na empresa foram implantadas com foco no fortalecimento da equipe, no controle da receita e do lucro, na quantificação de dados para aprimoramento das análises e na busca por contratos e obras maiores dos que até então eram executados pela empresa.
“Já nos primeiros meses ao lado do meu pai, vi o quanto a empresa tinha inúmeros pontos positivos e o quanto ela era forte por toda a história que ele construiu. Assim, percebi que se fizéssemos pequenos ajustes, teríamos a chance de crescer ainda mais”, destaca. Edio Filho conta, ainda, que cada vez que tinha uma dúvida sobre um problema, questionava o fundador da Castanhel. “Todos os assuntos que eu não sabia como resolver, por nunca ter passado por aquilo antes, sempre perguntava ao meu pai como poderia solucionar, pois ele já havia passado por cada situação pelo menos umas cinco vezes na vida. Ele, uma pessoa otimista, enxergava os acontecimentos de uma forma mais natural e me passava muita segurança para encarar os desafios”, lembra.
Pandemia acelerou o processo
Assim como aconteceu em inúmeras empresas, a pandemia, que chegou ao Brasil em 2020, também acelerou alguns processos na construtora. Entre eles, a sucessão oficial do negócio.
Edio Castanhel, por ser do grupo de risco, se afastou das rotinas da empresa e o filho precisou, de fato, tomar o comando do negócio.
“Foi um momento difícil, mas ao mesmo tempo, uma virada de chave na minha vida e na empresa. E apesar de a pandemia ter chegado de repente, nós já estávamos estruturando a sucessão da empresa. Eu já estava me preparando para assumir o posto, o que acabou sendo menos ‘traumático’, podemos dizer”, avalia.
Deste então, Edio Filho assumiu e permaneceu na liderança dos negócios da família. Hoje, o pai segue em atividade na empresa e auxilia o filho com sua experiência, o otimismo e a visão do negócio.
“Junto comigo, entraram também novos colaboradores com o intuito de dar continuidade a tudo que já havia sido construído até então. E, desde que iniciei as atividades, já executamos mais de 100 obras na região e também em diferentes estados, como RS, SP, AL, SE e PR. A empresa está em busca constante de melhorias com o objetivo de entregar o máximo de valor ao cliente, mantendo a credibilidade e sempre buscando novas tecnologias construtivas”, relembra.
Preparação para o mercado em constante mudança
Um dos desafios na sucessão familiar, segundo a Pesquisa Global NextGen 2022, é que a próxima geração de líderes de empresas familiares está seguindo o exemplo de seus pais e priorizando o crescimento, em detrimento dos aspectos de sustentabilidade e governança, como forma de proteger seu legado.
Isso reflete, por exemplo, os dados de um estudo do Banco Mundial que mostra que apenas 30% das empresas familiares chegam à terceira geração. Além disso, somente cerca de 62% dos líderes empresariais no Brasil dizem ter estruturas formais de governança implantadas, como acordos de acionistas, constituições, protocolos familiares e testamentos, segundo a PwC.
“A sucessão é um desafio, mas é uma necessidade para manter uma empresa viva no mercado. E ela precisa ser planejada, discutida, formalizada. No início, me preocupava e me incomodava bastante o fato de eu ser ‘filho do dono’, mas ao longo do tempo fui amadurecendo e dando o meu melhor. Afinal, eu sempre serei o ‘filho do dono’. Para que eu pudesse ficar mais tranquilo e continuar a evolução coletiva na empresa, foi, e é essencial, ter os colaboradores certos e nas posições certas”, acredita.
Diferentes de outros mercados, o da construção civil trabalha com prazos de entrega mais dilatados após a venda contratual. As obras desenvolvidas têm prazo médio de seis a doze meses, dependendo das particularidades do projeto. Além disso, inúmeros fatores interferem no desenvolvimento do trabalho como mão de obra, clima, cadeia de suprimentos, gestão de processos e equipes, terceirização, financeiro, logística de máquinas e equipamentos.
“Nossa missão como empresa é ‘desenvolver a melhor solução técnica de engenharia para os nossos clientes, otimizando os custos da sua obra’ e é isto que fazemos diariamente na construtora Castanhel. E para cumprir nossa missão, fortalecemos o formato de obra no modelo turn key, popularmente chamado de ‘chave na mão’ nos segmentos industrial, comercial, saúde, educacional e infraestrutura. “Nosso objetivo é fazer com que o cliente continua focado na sua operação, sem ter que se preocupar com a obra. Nos responsabilizamos do início ao fim da execução, dando a ele tranquilidade que tudo sairá conforme o planejado”, conta.
De acordo com ele, a formalização de processos trouxe crescimento significativo para a empresa:
“Nosso objetivo é ter certeza de que cada um dos colaboradores está cumprindo suas próprias metas. Utilizamos o principal software de gestão da construção civil, o Sienge, para tomar as melhores decisões. Ao longo dos anos, também entendi que ajuda externa, como uma consultoria, é necessário quando atingimos um limite com os recursos próprios e que por estarmos todo dia na operação acabamos não enxergando alguns pontos de melhoria que outro profissional pode nos apontar”.