Se você reclama que a sua empresa tradicional não permite mais flexibilidade no modelo de trabalho, optando por alternativas com que aprendemos a lidar no pós-pandemia, seja elas híbridas ou remotas, então saiba que até o Nubank também vem mudando de postura.
Anunciado no último dia 06 de novembro, seus funcionários terão de ir ao escritório 3 vezes por semana até 2027. A medida é gradual e começará em 2026.
Atualmente, a exigência para frequentar o escritório é de 1 semana por semestre. A informação é de Gabriela Cecchin, da Folha.
Uma mudança e tanto.
Das grandes empresas que conhecemos, ela não foi a primeira e nem será a única. No último ano, diversas empresas, como Petrobras, Amazon, Mercado Livre, Itaú e Correios, mudaram regras internas e intensificaram o retorno ao presencial.
Seus 9.500 colaboradores precisarão atender a uma série de critérios, como senioridade, desempenho e distância do escritório, para serem elegíveis.
O próprio banco aponta que terá casos que exigirão flexibilidade, mas ressalta que serão raros.
Embora a estratégia venha sendo pensada há meses e a mudança a ser implementada contemplasse diferentes fases que poderão mitigar os impactos da decisão, o que chamou a atenção foi a justificativa dada pela empresa.
A empresa justifica o fortalecimento da sua cultura, a inovação e o desempenho operacional. Mas será mesmo?
No ano passado, a FIA Business School, em parceria com a Faculdade de Economia e Administração da USP, apresentou o resultado de uma pesquisa que entrevistou mais de 1.300 profissionais de diversos setores e revelou que 94% deles acreditam que o home office melhorou suas vidas.
E ainda trouxe que a qualidade do trabalho e a produtividade se mantiveram as mesmas (ou até superior) quando comparada ao trabalho presencial – 88% e 91% respectivamente.
Exigir a presença física das pessoas pode não ser tão importante quanto o estímulo no equilíbrio vida e trabalho, com a valorização do workaholic e suas imensas noites de trabalho, mensagens nos finais de semana e feriados.
Ou na própria saúde da liderança. Muitas dessas, quando mal preparadas ou negligentes com a sua função, acabam escondendo os reais motivos de uma cultura tóxica que em nada tem a ver com presença física.
Ou a baixa segurança psicológica que impede a expressão autêntica das pessoas e o contraditório, criando uma pressão da hierarquia na contribuição de novas ideias e um autoritarismo velado.
Não estou afirmando que esse é o cenário atual do Nubank, mas o fortalecimento da sua cultura, da inovação e do desempenho operacional, como justificativa para esse movimento de retorno ao presencial, pode acontecer de outras formas também.
Há quem vá um pouco mais além. Não convencidos de que a produtividade não cai no home-office, há quem aponte justificativas especulatórias que forçam empresas a justificarem os seus aluguéis mensais para os acionistas.
Em 2023, estudos já apontavam prejuízos projetados por imóveis corporativos mundo a fora que poderiam chegar a US$800 bilhões até 2030. Ou seja, não é apenas a cultura e a inovação que podem estar ameaçadas neste modelo de trabalho; os rendimentos de fundos imobiliários que dependem da redução da vacância de seus edifícios caros e modernos também.
Independentemente da razão que motiva o Nubank e outras empresas a retornar para o presencial, a discussão ainda é válida e não vejo uma luz no fim do túnel.
Se o pós-pandemia foi apenas um período de adaptação inevitável para a redução de contágio do vírus, permitindo o home-office mundo à fora, é preciso deixar isso claro para os atuais (e novos) talentos.
Pois a necessidade de flexibilidade ainda é uma realidade e há quem a considere como um diferencial.
Se até fintechs como a Nubank, oriundas de movimentos disruptivos e inovadores, estão se submetendo ao modelo presencial como aprendemos e nos adequamos no século passado, é porque o movimento de retornar aos escritórios já se consolidou — o que é péssimo para muita gente.
E por fim, arrisco a dizer que esse movimento não deixa de ser um símbolo cultural dessa nova fase do banco. Você já ouviu aquele ditado: “quem não é visto, não é lembrado”?
Pois bem, mesmo com uma personalidade descolada e moderna, há quem a interprete como comando e controle.