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Quando a cultura do “abraçar árvore” passa dos limites

Quando falamos de um ambiente para se trabalhar, os elementos da sua cultura organizacional são logo lembrados. Quando a gestão cultural é pouco desenvolvida, o seu lado sombrio logo é lembrado e entende-se que é nele que o negócio acaba perdendo como um todo. 

Um ambiente com alto sentimento de medo e insegurança, assim como as lideranças desalinhadas e que não seguem as regras internas, além de baixa confiança e terceirização da culpa constante, são alguns aspectos que podem representar esse lado mais sombrio de uma cultura.

Logo, caso você seja perguntado o que pode prejudicar a saúde da sua cultura organizacional, esses e outros aspectos citados podem vir imediatamente na sua resposta. 

E se o contrário também representar uma ameaça? Se uma cultura de ser tão bonzinho também apontar sombras importantes para serem enfrentadas?

Pois é, isso também pode ser uma realidade. É quando o popularmente chamado “cultura de abraçar árvores” passa dos limites e aquilo que deveria ser uma virtude organizacional, acaba se tornando uma disfunção.

Apesar de soar estranho, uma cultura excessivamente amigável pode ocasionar um falso senso de harmonia organizacional como uma forma de evitar conflitos importantes, além de pressionar um criticismo construtivo e ainda reduzir completamente a inovação.

Para explorar um pouco mais essa disfunção, vou destacar três ameaças desse excesso que pode prejudicar a gestão da sua cultura organizacional. 

Exagero no consenso

As fricções são constantemente evitadas, principalmente em um cultura “too nice”. Eu prefiro criar um consenso para tudo como um gesto relacional e diplomático entre as partes. O que uma coisa não tem nada a ver com a outra.

Quando eu falo de fricção, estou me referindo na criação de uma condição saudável de discussão segura, de uma forma produtiva de dissidência, entendendo que toda opinião diferente e construtiva pode, e deve, ser expressada pelo bem comum.

E quando eu falo de diplomacia, eu considero interesses e particularidades de todos representados e defendidos como parte do diálogo.

Dito isso, quando não há esse espaço saudável para fricção entre as pessoas, há uma falta de energia e, se não energia, há ausência de criatividade. E é justamente esse conflito produtivo que gera momentos de inovação entre as pessoas. 

Quando uma liderança busca constantemente agradar a tudo e a todos, essa liderança não está considerando essa fricção e energia. 

Inclusive, o uso excessivo desse espírito bonzinho dentro da organização pode representar um sinal de fraqueza também, como uma ausência de confiança e convicção. 

E assim, quando as lideranças estão criando um espaço para evitar conflitos produtivos buscando o consenso exagerado, estamos escondendo mais problemas do que enfrentando-os. É um caminho direto para a positividade tóxica.

Evitar a competição

Em determinadas culturas, a palavra competição traz uma série de estigmas pouco explorados que muitas vezes, injustamente, viram tabus organizacionais.

Se anteriormente falei sobre o exagero no consenso, a baixa competição é uma consequência. 

Uma vez que criada as condições adequadas para esse tipo de estímulo, os resultados podem ser bem positivos. Além de servir como uma motivação adicional para algumas pessoas, a competição também pode gerar mais inovação e criatividade, além de provocar o desempenho coletivo para um estágio ainda maior de qualidade. 

Em uma cultura excessivamente amigável, esse tipo de condição sequer é considerada ou experimentada. O alto senso de pertencimento e coletividade excessivos podem sufocar estratégias que poderiam alavancar maiores oportunidades de negócios quando bem estruturadas. 

Colegas de trabalho que não realizam feedbacks de oportunidade

E por fim, o mais clássico aspecto de uma cultura dos moços e moças bonzinhos em uma organização: dificuldade de dar feedbacks construtivos. 

Na premissa de não ofender ou criar qualquer climão interno, esses momentos são evitados como o diabo que foge da cruz. 

Às vezes, a empatia nociva pode representar um problema ainda maior para organização do que uma boa conversa de feedbacks de oportunidade. E é justamente o exercício constante de feedbacks é o que pode criar uma musculatura emocional ainda mais resistente na organização. 

Aquilo que poderia ser dito frente a frente, de forma estruturada e profissional, atribuindo contexto, algum comportamento percebido e um impacto gerado, acaba virando uma conversa no cafézinho e se tornando uma bombinha relógio para mais uma intriga entre as pessoas.

Diferente de programas mais superficiais para reconhecimento individual, como ações que geram ‘likes’, proporcionam estrelas ou qualquer outro símbolo para os colaboradores, os feedbacks estruturados e ditos diretamente para as pessoas, podem ser muito saudáveis para o desenvolvimento organizacional.

Muitas vezes, esses estímulos superficiais podem representar uma terceirização do feedback autêntico e genuíno, não agregando em nada para a evolução do profissional senão apenas um simples afago na sua vaidade.

O desenvolvimento de um ambiente amigável é uma ótima recomendação para a força de uma cultura organizacional, mas o seu excesso pode representar uma ameaça silenciosa quando pensamos em inovação e crescimento dos negócios. 

Incentivos que vão além da superficialidade, demonstrando que o colaborador não só mereceu tal reconhecimento mas como ele também se desenvolveu como profissional; desenvolver um ambiente de feedbacks constante, com práticas estruturadas e seguras para se dizer o que precisa e; falar sobre os problemas organizacionais como devem ser falados, com direcionamentos adequados aos responsáveis e tratados coletivamente como um objetivo verdadeiramente organizacional — e não para servir como caças às bruxas.

É hora de repensar o modo “abraçar árvore” da sua cultura para que essa política de boa vizinhança excessiva não seja a raiz dos seus problemas organizacionais que você não está enxergando. Ou pior, não está querendo aceitar e enxergar.

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Líder de gestão de mudança e cultura na Central Ailos.

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