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Resiliente até que ponto?

Foto: Adriano Vizoni

Você já deve ter lido inúmeras vezes sobre a importância da resiliência no ambiente corporativo. O Fórum Econômico Mundial já coloca a competência entre as mais relevantes para os próximos cinco anos, ao lado de autogestão e tolerância ao estresse.

Mas há uma linha tênue que separa ser resiliente de aguentar tudo. É importante atentar se, por trás desse discurso de que se formos resilientes conseguiremos nos adaptar a qualquer mudança e ter força suficiente para dar a volta por cima, não há a ideia de que é necessário trabalhar demais ou insistir em projetos que não fazem sentido.

Alguns executivos com os quais conversei ao longo da minha carreira que tinham a convicção de que sempre é possível fazer mais, chegaram ao limite do estresse, se vendo à beira de um Burnout ou com problemas físicos sérios. 

Alguns estudos mostram que mesmo as competências adaptativas se tornam inadequadas quando levadas ao extremo. Uma pesquisa feita por Rob Kaiser, presidente da Kaiser Leadership Solutions, que atua na avaliação e desenvolvimento de líderes, aponta que forças excessivas se tornam fraquezas. Isso quer dizer que a resiliência pode, sim, ser prejudicial.

“Pessoas com esse perfil podem se tornar excessivamente persistentes com objetivos inatingíveis, ou tolerantes demais às adversidades”, diz Derek Lusk, ph.D em psicologia de negócios e chefe de avaliação executiva da AIIR Consulting, que atua no planejamento de sucessão, transformação de liderança e mudança de cultura. 

PODE SER A GOTA D’ÁGUA

Vou dar um exemplo. Um executivo com quem conversei para uma matéria da Você RH resolveu entrar no mundo do empreendedorismo e abrir mais um negócio em parceria com um fornecedor. Com a promessa de crescimento rápido e lucrativo, ele apostou todas as fichas na empresa, mas o tal parceiro desistiu.

Como estava no auge de sua resiliência, tinha confiança de que com adaptação, ele poderia resolver o problema, mesmo com todos ao seu redor dizendo que ele não deveria seguir. Foram 3 meses tentando, mas a operação não se sustentou.

“Minha resiliência e adaptabilidade atrapalharam minhas ações, que deveriam ter sido tomadas de forma mais firme”, contou. Isso gerou um grande estresse e o executivo teve uma úlcera.

Um dos sinais de que a resiliência passou do limite é, justamente, você não conseguir ter discernimento para saber se as metas são realistas ou não. Outro é não entender quando é hora de parar de dizer sim a tudo, mesmo que acumule atividades ou persista em objetivos inatingíveis.

Segundo Derek, algumas análises científicas mostram que a maioria das pessoas perde muito tempo persistindo em objetivos irreais, um fenômeno chamado “síndrome da falsa esperança”.

Mesmo quando comportamentos passados ​​sugerem que é improvável que as metas sejam atingidas, o excesso de confiança e um grau acima da média de otimismo, fazem com que as pessoas desperdicem energia em tarefas inúteis. Isso leva ao limite e gera problemas de saúde, físicos e mentais, sérios.

COMO ENCONTRAR A MEDIDA CERTA

Uma pessoa resiliente na dose certa se adapta, mas consegue voltar ao seu estado original, que tem a ver com seus valores, personalidade e as coisas de que não abre mão.

Bem semelhante ao que diz a física, que deu origem ao termo, se não conseguirmos retornar à forma original após sermos submetidos a tal deformação elástica, algo está errado.

Para encontrar a medida certa, a atenção aos sinais do corpo é essencial. Se anda estressado ou ansioso demais, com hábitos alimentares ou físicos em excesso, reagindo de maneira fria ao que acontece e sendo muito tolerante, é hora de rever sua postura.

“Resiliência não é aceitar tudo, não é ultrapassar seus limites”, diz Rafael Souto, presidente da Produtive, consultoria de planejamento e transição de carreira.

De acordo com ele, vende-se muito, atualmente, a história do antifrágil, que você não pode transparecer que está desconfortável e deve ser sempre forte.

“Mas mostrar que você precisa de ajuda  também está no rol das competências importantes”, diz. Para ele, a resiliência não pode ser uma máscara que nos impede de ver quando estamos esgotados. Senão, quem vai pagar a conta é seu corpo, física ou emocionalmente. 

Como bem diz Paula Davis-Laak, especialista em estresse e resiliência e fundadora do Davis Laack Stress & Resilience Institute, se você acha que resiliência é ser invencível e invulnerável está errado.

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Jornalista e apresentadora do podcast Happy Hour Com Elas

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